Área Q

 

O ET de Quixadá

 

O cinema brasileiro, assim como a cultura em geral, sempre lutou contra imensas dificuldades para se manter, seja pela censura do período da ditadura, seja pela eterna falta de recursos, e ainda pior nos dias atuais, com declarada aversão do governo de um certo capitão tresloucado. Mesmo assim, sobressaem-se produtos de excelente qualidade, reconhecidos mundialmente. Um destes bons exemplos é o filme “Área Q” (BRA/EUA, 2011), que reputo como original e imaginativo.

Nas últimas décadas, o cinema brasileiro tem oscilado entre comédias televisivas, histórias policiais e algumas produções voltadas para o público espírita. “Área Q” conseguiu fugir de todos estes estereótipos, levando para as telas uma história que advém da tradição de uma região, e ainda deixando mais dúvidas que respostas – o que é muito bom!

No início do filme o espectador acompanha a vida de João Batista (Murilo Rosa), um humilde fazendeiro de Quixadá, no interior do Ceará. Um dia, João é carregado por uma estranha luz, desaparecendo durante uma semana. Ao retornar, ele parece ter adquirido estranhos poderes, e termina sumindo de vez, embora todos acreditem que ele está vivo e alguns até afirmam que virou santo.

Trinta anos mais tarde, Thomas Matthews (Isaiah Washington), um jornalista americano, é enviado para Quixadá para investigar fenômenos paranormais que acontecem na região, possivelmente ligados a OVNIs, com relatos de luzes, aparições e de abdução de pessoas.

Thomas vem de um drama pessoal, pois o seu único filho desapareceu sem deixar vestígios, e por mais que ele tenha investigado, nunca encontrou o mais leve traço que pudesse indicar o destino do garoto.

Ao chegar na pequena cidade do sertão cearense, Thomas sofre o impacto do calor, da língua e da paisagem da região, com suas belas formações rochosas permeadas pelos cursos d’água.

Thomas recebe o suporte de Eliosvaldo (Ricardo Conti), um prestativo intérprete que serve de relações públicas, faz-tudo e companhia para o americano. Eliosvaldo não apenas traduz as palavras, mas a própria alma da região e a convivência entre dois representantes de culturas tão díspares proporciona alguns dos melhores momentos do filme.

Outra personagem constante é a enigmática Valquíria (Tânia Khalil), uma repórter brasileira que parece ter a ideia formada de que tudo o que acontece na região é apenas resultado de fenômenos naturais, que alimentados pela crendice e ignorância do povo, tornam-se casos fantásticos.

Mas Thomas não enxerga dessa mesma maneira, pois a cada dia ele descobre novas evidências que não só parecem ser reais, como também parecem relacionar-se com o desaparecimento do seu próprio filho, mesmo que os lugares dos acontecimentos estivessem a milhares de quilômetros de distância.

A busca de Thomas por respostas só o deixa com mais dúvidas, mesmo após encontrar-se com o mítico João Batista, que não apenas parece conhecê-lo, como também sabe o que aconteceu ao filho do jornalista. O mais intrigante é que Thomas e seu filho são considerados vitais para a sobrevivência da Humanidade.

O que me chamou mais a atenção no filme foi a forma brilhante como a história foi apresentada, não fazendo concessões ao explícito como faria Spielberg, e ao mesmo tempo deixando muitas dúvidas no espectador. Seriam ETs? Seriam espíritos? Seria loucura ou alucinação coletiva?

Apesar do filme ser brasileiro, os diálogos são praticamente todos em inglês. Isso ficou muito natural, pois americano não conhece outra língua e as pessoas que falavam com ele eram o intérprete, a jornalista e uma médica, pessoas que se supõe que falem inglês.

“Área Q” é um filme excelente, com um elenco enxuto, mas extraordinário, com destaque para Isahia Washington, bons efeitos especiais, fotografia maravilhosa, trilha sonora envolvente e perturbadora, e uma paisagem fantástica, que remete ao sobrenatural.

Este filme está disponível em Blu-Ray e DVD, e também no YouTube.