Claquete 22 de outubro de 2004
Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com
O que está em cartaz
Os lançamentos da semana são mais leves, com ênfase para as comédias românticas. As estréias são “A Nova Cinderela”, a velha história da gata borralheira, trazida para os dias atuais, “Meu Vizinho Mafioso 2”, seqüência da divertida história do dentista (Matthew Perry) e do assassino mafioso (Bruce Willys), “Mar Aberto”, drama e suspense em alto mar, e, “Menina dos Olhos”, sensível história do diretor Kevin Smith, com Bem Affleck, Jennifer Lopez e Liv Tyler. Continuam em cartaz “Residente Evil – Apocalipse”, com Milla Jovovich, em mais uma versão do famoso videogame, “Chamas da Vingança”, policial, com Denzel Washington, “A Dona da História”, drama nacional, com Marieta Severo e grande elenco, “Rei Arthur”, salada mista de Roma com a famosa lenda inglesa, “Show de Vizinha”, comédia romântica, e, o divertido desenho animado “Espanta Tubarões, da Dreamworks. E, no Filme de Arte, do Cine Natal 2, reapresentação da produção chilena “Sexo Com Amor”.
A Nova Cinderela
Sam Montgomery (Hilary Duff) é uma jovem estudante do ensino médio, que vive com sua madrasta Fiona (Jennifer Coolidge), e, as filhas dela, que a tratam da pior maneira possível. Sam leva uma vida sem grandes agitações, e, tem planos de cursar a Universidade de Princeton. Sua vida muda, quando ela conhece, através da internet, o seu príncipe encantado. Porém, logo Sam descobre que ele é, na verdade, Austin Ames (Chad Michael Murphy), um garoto popular, que é também jogador de futebol americano do time de sua escola. Temendo ser rejeitada por Austin, ela passa a tentar despistá-lo de todas as formas, tentando manter em segredo a identidade da garota com quem ele conversou através da internet. Já viu esta história antes? Claro que sim. Mas, sempre há espaço para uma nova versão, principalmente quando os sapatinhos de cristais são trocados por celulares… “A Nova Cinderela” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7, do Moviecom. Censura livre.
Mar Aberto
Daniel (Daniel Travis) e Susan (Blanchard Ryan) são um casal abastado, que decide entrar em férias, para descansar. Após chegar em um resort tropical, o casal inscreve-se em passeio de barco, para que possam mergulhar. O barco está repleto de mergulhadores, 20 ao total, o que faz com que eles se amontoem perto da cabine. Ao chegarem ao local de mergulho, os mergulhadores vestem seus trajes e recebem o aviso de que o mergulho será de 35 minutos, e, que a profundidade máxima é de 18 metros. Enquanto Daniel e Susan aproveitam o mergulho, observando enguias, os demais mergulhadores voltam à tona, e, sem notar a falta do casal, o barco parte, de volta às docas. Dez minutos depois, Daniel e Susan retornam à tona e não encontram mais o barco que os levou até o local. “Mar Aberto” foi baseado em uma história real, ocorrida em 1998, e, publicada em várias revistas de mergulho e jornais, ocorrida na grande barreira de corais da Austrália. O filme estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 4, do Moviecom. Para maiores de 12 anos.
Filme de Arte: “Sexo Com Amor”
O Filme de Arte do Cine Natal 2, desta semana, é a produção chilena “Sexo Com Amor”, dirigida por Boris Quercia. Um grupo de pais e educadores discute o modo que desejam que o colégio encare a educação sexual de seus filhos. “Sexo com Amor” é a história de três pais e de como o instinto erótico e suas emoções podem mais que suas razões. Luísa (Sigrid Alegría) é uma professora, que tem uma vida sexual cheia de surpresas, vivendo, no momento, um ardente romance com Jorge (Patricio Contreras), pai de um de seus alunos. Precisando discutir, em sala de aula, o tema educação sexual, Luísa passa a reanalisar seus próprios conceitos, e, percebe que os pais de seus alunos têm as mesmas dúvidas que ela. Produção chilena, difícil de se ver por estas bandas, “Sexo Com Amor” ganhou o Prêmio Especial do Júri e o de Melhor Diretor Estreante, no Festival Latino-Americano de Huelva. O Filme de Arte terá sessão única, às 21h, no dia 26, terça-feira, no Cine Natal 2. Para maiores de 18 anos.
Meu Vizinho Mafioso 2
Jimmy “Tulipa” (Bruce Willis) é um ex-assassino, que leva uma vida tranqüila, já que uma arcada dentária falsa, feita por seu amigo Oz (Matthew Perry), fez com que seus inimigos acreditassem que ele está morto. Porém, a situação muda, quando Cynthia (Natasha Henstridge), a esposa de Oz, é sequestrada pela máfia húngara. Para ajudar o amigo, Jimmy e Jill (Amanda Peet), decidem voltar ao mundo do crime. Seqüência de “Meu Amigo Mafioso”, de 2000. “Meu Amigo Mafioso 2” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 1, e, no Cine 6, do Moviecom. Para maiores de 14 anos.
Menina dos Olhos
Ollie Trinke (Ben Affleck) é um homem casado, e, bem-sucedido no emprego, que parece ter tudo o que sempre quis na vida. Porém, sua vida de sonho desmorona, com a súbita morte da esposa Gertrude (Jennifer Lopez), deixando uma filha, Gertie (Raquel Castro), para Ollie criar. Totalmente ignorante sobre o que é ser pai, Ollie decide, então, deixar o emprego, amigos e toda a sua vida social, para morar em Nova Jersey, na casa do seu próprio pai (George Carlin), onde foi criado. Lá, enquanto ele tenta encontrar ânimo para seguir em frente, Gertie acha que Nova Jersey é um verdadeiro paraíso. Mais um filme do inventivo diretor Kevin Smith, explorando os recônditos da alma humana e do seu rincão natal, longe das luzes de Manhatann. Como sempre, o elenco é formado pelos amigos de Smith, como Affleck, Liv Tyler, Jason Lee, e, Matt Damon, entre outros. Outros filmes de Smith são “Barrados no Shopping”, “Procura-se Amy”, “Dogma”, e, “O Império (do Besteirol) Contra-Ataca”. “Menina dos Olhos” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 5, do Moviecom. Censura livre.
Jerry Lewis, finalmente, em DVD!
Depois uma longa espera, finalmente as novas gerações terão a oportunidade de conhecer um dos maiores gênios do cinema humorístico de todos os tempos. Não é Charles Chaplin, mas Jerry Lewis foi tão produtivo e multitarefas quanto o genial vagabundo. Dono de um humor ingênuo, mas não menos inteligente, Lewis deliciou platéias do mundo inteiro nas décadas de 50 e 60. A Paramount anunciou o lançamento, em DVD, de seis filmes produzidos entre 1956 e 1964: “O Delinqüente Delicado”, “O Mensageiro Trapalhão”, “O Mocinho Encreiqueiro”, “O Otário”, “O Terror das Mulheres”, e, a obra-prima de Lewis, “Professor Aloprado”, dirigido e estrelado pelo genial comediante. “Professor Aloprado” seria refilmado em 1996, com Eddie Murphy nos papéis principais. Promete-se material inédito, nos extras, para alegria dos fãs. É aguardar pra ver!
Filme recomendado: “Treze Dias Que Abalaram o Mundo”
Treze dias em Camelot
Muita gente não entende o porquê do mundo inteiro acompanhar, com preocupação, os resultados das eleições presidenciais americanas. Como eles são a nação mais rica, e, a mais poderosa, militarmente falando, é natural que a escolha do governante deles afete as relações com o resto do planeta. Enquanto eles levam semanas para contar todos os votos (um a zero p’ra nós!), vale à pena lembrar do que pode acontecer ao mundo, em função das decisões deles. Quarenta e um anos atrás, o então presidente John Fitzgerald Kennedy lançou o mundo em estado de alerta, num episódio obscuro, que colocou, à porta de uma guerra nuclear os Estados Unidos e a União Soviética. Um dos primeiros filmes a explorar um pouco mais criticamente o caso é “Treze Dias Que Abalaram o Mundo”, do diretor Roger Donaldson.
Bem diverso do que o mito estabelece, Kennedy era um incorrigível mulherengo, extremamente ambicioso, que prosseguia o projeto do pai para dominar o poder na América. Junto com o irmão Bob (Robert Kennedy, que também seria assassinado em 1968), conduzia a presidência como uma forma de alcançar as suas metas pessoais. Os dois acreditavam que eram pessoas especiais, não sujeitas às regras que impunham aos demais mortais.
A corrupção, e, o uso do Estado, para fins pessoais, era uma longa tradição na família de JFK desde os avós. O pai, Joseph Kennedy, chegou a ser embaixador na Inglaterra, graças à amizade com o filho do então presidente Roosevelt. Terminou perdendo o cargo, e, a chance de concorrer à presidência, por conspirar contra o próprio chefe da nação. Hoje, sabe-se que esteve envolvido até com contrabando de bebidas, durante a Lei Seca, usando inclusive o cargo de embaixador para conseguir espaço nos navios para suas cargas ilegais.
Através de um projeto muito bem definido, John Kennedy iniciou sua carreira rumo à presidência. O candidato natural era Joe, o filho mais velho, que desapareceu durante a Segunda Guerra. Usando todos os meios, possíveis e imagináveis, JFK passou pelo senado, e, finalmente, alcançou o cargo máximo do executivo americano. Para chegar lá, utilizou os serviços de um velho amigo da família, Sam Giancana, mafioso de Chicago. Depois das eleições, muitas acusações de fraude eleitoral em Illinois chegaram ao Departamento de Justiça – que era chefiado por Bob Kennedy. Nenhuma das acusações chegou a ser investigada, obviamente.
As relações de Kennedy com o gângster Giancana incluíram planos para o assassinato de Fidel Castro, e, uma amante comum, Judith Exner. Segundo a própria, bolsas cheias de dinheiros eram enviadas, através dela, do presidente para o mafioso, ou, de empresários californianos para JFK.
Todas as atividades da família Kennedy eram acompanhadas desde a década de quarenta por Edgar Hoover, diretor do FBI. Por acreditar que a instituição da presidência era mais importante que o homem que a ocupava, Hoover não impediu que Kennedy se elegesse. Em compensação, a sua recondução como diretor do birô foi um dos primeiros atos do jovem presidente.
Assim como Hoover, o Serviço Secreto também acreditava que tinha que preservar a imagem do presidente – coisa que ele próprio não se preocupava. Algumas vezes, os agentes que guardavam o presidente tinham que fazer milagres, para impedir que a primeira-dama, Jackie, entrasse na área de lazer da Casa Branca, onde John e Bob faziam animadas festinhas, com prostitutas de todos os níveis.
A crise dos mísseis de Cuba foi o grande evento do governo Kennedy. A pequena ilha do Caribe estava atravessada na garganta de JFK desde abril de 1961. Nessa data, uma brigada de 1400 refugiados cubanos, apoiados pela CIA, desembarcou na Baía dos Porcos, para tentar derrubar Fidel Castro. A desorganização do golpe, aliado à retirada de apoio aéreo – ordenada pelo próprio JFK – resultou na morte de 112 invasores, e, na prisão do restante. Foi um fiasco completo.
Em meio a planos mirabolantes para assassinar o líder cubano, os americanos descobriram, através dos vôos do avião de espionagem U-2, que, bases para lançamento de mísseis balísticos estavam sendo montadas, em Cuba. Os “treze dias”, que deram o título ao filme, referem-se ao período entre a descoberta, e, o tempo em que ficariam operacionais. Pela versão oficial, Kennedy impôs um bloqueio naval em Cuba, que forçou os russos a retirarem os mísseis. Aplausos homéricos.
A história por baixo do pano é um pouco diferente. Mesmo numa época de corrida armamentista, o poderio militar soviético era muito inferior ao americano. Para se ter uma idéia, enquanto os Estados Unidos tinham trezentos lançadores de mísseis, os russos teriam no máximo quarenta e quatro – já contando com os de Cuba.
No seu ódio irracional para com os cubanos, Kennedy bravateava numa posição de valentão, enquanto corria desesperadamente, junto com o irmão Bob, para uma solução negociada. Para isso, utilizaram até os serviços de um agente da KGB, bypassando os canais diplomáticos formais.
Ninguém queria uma guerra nuclear, mas, acima de tudo, Kennedy queria a reeleição. Por isso, mesmo tendo feito um acordo com Khrushchev, o líder da União Soviética, manteve a propaganda de valentão do mundo. Pelo acordo, os mísseis soviéticos seriam retirados de Cuba, em troca de mísseis americanos na Turquia e – o mais importante – a garantia de que a ilha de Fidel jamais sofreria uma invasão dos Estados Unidos. Os cubanos é que foram os grandes vencedores da crise dos mísseis.
Para o mundo, o que se via era a véspera de um holocausto nuclear. A frota do Comando Aéreo Estratégico, com mais de 1400 bombardeiros B-52 e B-47, além de 174 mísseis balísticos intercontinentais, entrou em DEFCON 2, que é o último estágio antes da guerra total. Um oitavo de todos os aviões bombardeiros americanos ficou no ar, durante trinta dias. Mais de cem mil homens foram posicionados na Costa Leste, enquanto que uma força naval, com quarenta mil fuzileiros, navegava no Caribe e Atlântico Sul. Enquanto isso, do lado soviético, não havia nenhuma atividade que não fosse de rotina.
Como os Kennedy pretendiam se manter pelo menos mais dez anos no poder (com uma reeleição de John, e, depois, a dobradinha Bob-John), é possível que os soviéticos tenham preferido deixar os americanos saboreando uma vitória falsa, e, ficar com informações que praticamente manteriam os Kennedy em suas mãos. Só a morte de John desfez tanto as ambições dos Kennedy como essa hipotética ameaça russa.
O filme “Treze Dias Que Abalaram o Mundo” toca em vários desses pontos delicados, inclusive nas negociatas conduzidas pelos irmãos, mas, evita mostrar o lado mais pessoal (e desarrumado) de JFK. A história é mostrada pelo ponto de vista do principal assessor de Kennedy, Kenneth O’ Donnell, sobre quem pesaram acusações de desvio de dinheiro da campanha de 1964, para uso próprio. Quem vive o papel é Kevin Costner, que já estrelou um outro filme sobre Kennedy, “JFK – A Pergunta Que Não Quer Calar” onde interpretava o promotor que investigou a morte do presidente. É uma pena que Bruce Greenwood, ator escolhido para o papel de Kennedy, não fosse mais parecido com o próprio. Afinal de contas, é incontestável o charme e o magnetismo pessoal de JFK.
Lamentavelmente, a edição latina em DVD não fez jus ao tema. O formato de tela é Full Screen, o áudio oferece as opções inglês ( 5.1 e 2.0) e português 2.0. Como extras, um Making Of legendado em espanhol (!) de treze minutos, que nada mais é do que cenas de bastidores, algumas entrevistas com os atores, trailer e biografias do elenco. Teria sido fantástico se tivesse sido acrescentado alguma coisa a mais sobre os fatos históricos reais.
Apesar de não ter ido mais a fundo na personalidade de JFK, o filme “Treze Dias Que Abalaram o Mundo” é um exercício muito bem feito de cinema. Nele há uma mistura de filme de ação, relato histórico, drama político e reconstituição de época. Afinal de contas, não existe uma verdade absoluta, é preciso que formemos a nossa própria crença a partir do máximo de informações disponíveis. Este filme é uma fonte delas.