Claquete 03 de dezembro de 2004
Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com
Chegou o Carnatal, para alegria de muitos, e, irritação de alguns. Bem, se a sua praia não é ficar olhando um monte de gente vestida com a mesma roupa, dançando com o mesmo tipo de música, vale dar uma conferida nos cinemas da cidade. As estréias da semana são as comédias “Bridget Jones, No Limite da Razão”, com Renée Zellweger, “As Branquelas”, dos irmãos Wayans, “Um Natal Muito Louco”, com Tim Allen e Jamie Lee Curtis, e, “A Sétima Vítima”, suspense espanhol, estrelado por Anna Paquin. Nas continuações, “Má Educação”, filme do grande diretor espanhol Pedro Almodóvar, tocando no delicado tema do abuso sexual de crianças, “O Expresso Polar”, interessante fantasia em animação gráfica, onde o veterano Tom Hanks serviu de modelo para nada menos do que seis personagens, o suspense “Os Esquecidos”, com a talentosa Julianne Moore, o documentário “Edifício Master”, a comédia romântica “Como Fazer um Filme de Amor”, e, “Celular – Um Grito de Socorro”, suspense com a ótima Kim Basinger. Em pré-estréia, o filme independente “Anjo de Vidro”, de Chazz Palmintieri. No Filme de Arte, do Cine Natal 1, uma produção dinamarquesa, “Corações Livres”.
Estréia 1: “Bridget Jones no Limite da Razão”
A desparafusada Bridget Jones volta à cena, mais uma vez, metendo-se em gafes, enquanto tenta administrar suas incertezas. Bridget Jones (Renée Zellweger) está namorando firme Mark Darcy (Colin Firth) há seis semanas. O que deveria ser um paraíso, transforma-se em dúvidas e incertezas, quando ela passa a questionar o que deve fazer, para manter o homem de seus sonhos ao seu lado. A situação fica ainda pior após a contratação da nova colega de trabalho de Mark, de quem Bridget morre de ciúmes, e, o reaparecimento de Daniel Cleaver (Hugh Grant), seu ex-chefe mulherengo, que volta a assediá-la. “Bridget Jones no Limite da Razão” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 6 do Moviecom. Para maiores de 14 anos.
Estréia 2: “As Branquelas”
Os irmãos Marcus (Marlon Wayans) e Kevin Copeland (Shawn Wayans) são agentes do FBI, que estão com problemas no trabalho. A última investigação da dupla foi um grande fracasso, e, eles estão sob a ameaça de serem demitidos. Quando um plano para seqüestrar as mimadas irmãs Brittany (Maitland Ward) e Tiffany Wilson (Anne Dudek) é descoberto, o caso é entregue aos principais rivais dos irmãos Copeland, os agentes Vincent Gomez (Eddie Velez) e Jack Harper (Lochlyn Munro). Para aumentar ainda mais a humilhação da dupla, eles são escalados para escoltar as jovens mimadas, do aeroporto até o local de um evento, pelo qual elas esperaram por meses. Porém, no trajeto, um acidente de carro provoca um verdadeiro desastre: enquanto uma das irmãs arranha o nariz, a outra corta o lábio. Desesperadas, elas se recusam a ir ao evento. É quando, para salvar o emprego, Marcus e Kevin decidem assumir as identidades das irmãs. A dupla principal, e, o diretor Keenan Ivory Wayans, são os irmãos que criaram a genial saga “Todo Mundo em Pânico”. “As Branquelas” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 1 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.
Estréia 3: “A Sétima Vítima”
Adolescente se muda, com os pais, para uma pequena cidade, mas, vai descobrir que sua nova casa guarda terríveis segredos do passado, que podem destruir sua família. Quando começa a investigar o que ocorre, com a ajuda do namorado espanhol, ela descobre alguns fatos perturbadores. Aparentemente, a residência gótica foi construída para ser o local de um culto satânico, quatro décadas antes. Ela ainda fica sabendo que um assassino serial raptou, e, assassinou, algumas crianças, na mesma época, pelas redondezas. E, os corpos nunca foram encontrados. Primeiro em língua inglesa do espanhol Jaume Balagueró, o filme conta ainda com a estrela Anna Paquin (“O Piano”, “X-Men”). “A Sétima Vítima” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 4 do Moviecom. Para maiores de 14 anos.
Estréia 4: “Um Natal Muito Louco”
A família Krank sempre passou o Natal junto, mas, este ano, será diferente. Com Blair (Julie Gonzalo) trabalhando, como voluntária, no Corpo de Paz, no Peru, Luther (Tim Allen) e Nora (Jamie Lee Curtis) já estão se conformando em ter que passar um Natal solitário. Até que Luther vê um cartaz exposto em uma agência de viagens, anunciando uma excursão ao Caribe. Ao fazer as contas, Luther percebe que, caso sua família não tenha uma festa natalina, ele e Nora poderão viajar. Inicialmente relutante, Nora termina por concordar com a idéia. Quem não se conforma com isso são os vizinhos do casal, principalmente após Luther decidir não colocar no telhado seu tradicional boneco de neve iluminado, o que pode fazer com que a rua em que mora não ganhe o tradicional concurso de decoração natalina. Após várias desavenças com os vizinhos, os Kranks são obrigados a mudar de planos, quando Blair liga e avisa que poderá passar o Natal em casa, com eles, dando-lhes apenas 24 horas para organizar tudo. “Um Natal Muito Louco” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. Censura livre. Atenção: cópia dublada.
Pré-Estréia: “Anjo de Vidro”
É Natal em Nova York. As ruas estão cobertas de neve, músicas natalinas estão por toda parte, e, as pessoas andam apressadas, em direção às lojas, para comprar os presentes de última hora. Porém, um grupo de pessoas está completamente à parte deste clima. Entre eles, Rose (Susan Sarandon), uma mulher emocionalmente frágil cuja mãe está no hospital, e, Mike (Paul Walker), um policial que briga com um homem mais velho (Alan Arkin). Porém alguns encontros na véspera de Natal fazem com que eles repensem a vida. Primeiro filme feito para o cinema dirigido por Chazz Palmintieri, traz um misto de drama, romance, comédia e espiritismo. “Anjo de Vidro” terá uma pré-estréia, de sexta-feira a domingo, no Cine 2 do Moviecom, na sessão de 21h40. No sábado, sessão extra, às 23h40. Censura livre.
Filme de Arte: “Corações Livres”
O Filme de Arte desta semana traz a produção dinamarquesa “Corações Livres”. O que acontece, quando o destino estala os dedos, e, dá uma reviravolta em nossas vidas, sem avisar? Esta é a questão central, que a cineasta dinamarquesa Susanne Bier levanta, e, procura responder, em seu novo longa-metragem. Um jovem casal espera ansiosamente pelo seu casamento, quando, algo inesperado acontece. “Corações Livres” é um filme sobre as promessas que não podemos manter, e, a vida que não podemos planejar. É um filme sobre a vida, o verdadeiro amor, e, a responsabilidade pelas pessoas que nós amamos. A sessão Filme de Arte será no Cine Natal 1, no dia 7, terça-feira, às 21h.
“O Piano”, em DVD, nas bancas
Esse, vale à pena! Está à venda, encartado em uma revista, o DVD do filme “O Piano”, belíssima produção neo-zelandesa, de 1993, ganhadora dos Oscar de Atriz (Holly Hunter), Atriz Coadjuvante (a estreante Anna Paquin) e Roteiro, além de mais cinco indicações, incluindo a de Melhor Filme. No século XIX, uma mulher, muda desde os seis anos de idade, deixa a Grã-Bretanha, rumo a Nova Zelândia, para casar-se com um fazendeiro. Lá, passa a ser cobiçada por um rude vizinho, num intrincado jogo de sedução. Curiosidade: apesar de Anna Paquin ter ganho um Oscar, por sua atuação no filme, foi proibida de assisti-lo, pois tinha apenas onze anos, na época. Com áudio em inglês, foi mantido o formato de tela original de cinema.
Antonioni, DVD, e, censura
Chega ao mercado, graças ao DVD, mais uma obra-prima do genial diretor italiano Michelangelo Antonioni, “O Grito”, de 1957, contando a saga do operário Aldo, em sua jornada existencial pelas estradas da Itália, em busca de respostas. Mas, se os cinéfilos comemoram a reedição dos clássicos, no formato digital, estão se deparando com um outro problema: a censura. O filme mais famoso de Antonioni, “Blow-up – Depois Daquele Beijo”, foi lançado, em DVD, censurado, com borragem eletrônica e corte de enquadramento, em algumas cenas de nudez. O filme pode ter sido ousado, para o ano de 1966, quando foi lançado, mas, certamente, não é mais chocante do que algumas cenas das novelas atuais. E, o mais grave de tudo, é que está se mutilando uma obra original! É como se, alguém resolvesse cobrir os seios da “Vênus” de Botticelli, por considera-los imorais. Minha gente, a imoralidade está nos olhos de quem vê…
Filme recomendado: “Tolerância”
Nem sempre a verdade é a melhor solução
Os fins justificam os meios. A famosa e polêmica frase, cunhada por Maquiavel, para retratar a imoralidade dos seus tempos, infelizmente, ainda ecoa, com sucesso, nos dias de hoje. Como, em nosso país, “O Príncipe” deve ser o livro de cabeceira de muita gente, talvez seja esta a razão do quase-caos social em que vivemos. Com muita propriedade, o diretor Carlos Gerbase desenvolveu um interessante filme, baseado neste tema. “Tolerância” mostra um pouco deste paraíso amoral, que se chama Brasil.
O enredo do filme faz uma salada mista de “Lolita”, “Corpos ardentes”, e, “Pagador de promessas”, resultando, por incrível que pareça, em um filme envolvente, que consegue prender a atenção até o final.
O filme mostra um casal moderno, saído da juventude hippie, e, hoje, vivendo bem integrados ao sistema. Márcia é uma advogada bem sucedida, enquanto o marido, Júlio, é fotógrafo e editor gráfico. Completa a família, Guida, a filha de dezessete anos, semi-independente, que sonha em tornar-se guitarrista de uma banda. O casal tem um pacto de tolerância, onde cada um pode exercer a sua liberdade, desde que seja absolutamente sincero com o outro. Júlio tem as suas insatisfações íntimas, que descarrega nas salas de bate-papo da internet, sob o codinome Ivanhoé, tendo uma parceira virtual de apelido Sabrina.
Tudo se manteria muito bem, não fosse a revelação de Márcia, de que fizera amor com um cliente. Júlio não consegue administrar a traição, já que reprimia os seus próprios desejos. A situação se complica com a chegada de Ana Maria, a sensual amiga de Guida, que, aos poucos, vai envolvendo-se com o pai da amiga. Em paralelo, o cliente-amante de Márcia precisa de sua atenção profissional, pois a sua vida passa a correr perigo, num conflito de terras com um meio-irmão. A história segue, com todos os fios enrolando-se numa trama complicada, onde a passionalidade é a cortina de fumaça, para uma ação fria e planejada. Ponto. Paro por aqui para não tirar o interesse do espectador, já que a surpresa do desenlace faz parte do prazer de quem for assistir o filme.
E, onde está o Maquiavel nessa história? Logo no começo, duas situações, totalmente diferentes, mostram soluções iguais. Na primeira, o posseiro, acusado de assassinato, quer confessar que foi ele quem deu o primeiro tiro. A advogada convence-o a desistir, com a seguinte frase: “Nem sempre a verdade é a melhor solução”. Para garantir a liberdade do cliente, o falso testemunho. Só fora invertida a ordem dos tiros, mas, significaria a liberdade, ou, a cadeia, para ele.
No segundo caso, ao fotografar uma modelo, nua, o editor de uma revista masculina, tem que escolher, entre ter um grande prejuízo, ou, deixar que Júlio faça uma “cirurgia plástica”, com o computador. Para isso, ele copia o bumbum de uma outra garota, e, cola na edição final. Nem o fotógrafo, nem a modelo, gostam, mas, são obrigados a aceitar o fato.
A aparente diferença de objetivos (a liberdade de um homem, e, uma foto melhor numa revista masculina) não difere muito, se levarmos em conta como foram alcançados (um falso testemunho, e, uma fraude fotográfica). Ambas as situações foram antiéticas, e, usadas com a desculpa de que os fins justificam os meios. Essa situação será repetida no filme, e, fica como dever de casa, para quem vai assisti-lo, identificar porque a ética foi o valor menos considerado pela advogada.
O filme tem algumas cenas de sexo simulado e de seminudez, que fizeram com que fosse proibido para menores de dezoito anos. Isso não classifica o filme como imoral, pois imoral é a sociedade ali retratada, infelizmente com muita fidelidade. Imoral é considerar-se esses pequenos deslizes normais, por terem um objetivo mais nobre. É pensando dessa maneira que, daqui a pouco, estaremos queimando índios porque pensamos serem mendigos, ou, corrompendo deputados para evitar uma CPI da corrupção! Ainda bem que estamos longe disso…
O elenco está excelente: Maitê Proença e Roberto Bontempo interpretam o casal em crise, Márcio Kieling é o amante, e, Ana Maria Mainieri é a sensual Ana Maria. Esta, aliás, materializa uma deliciosa referência ao filme “Instinto selvagem”. A cidade de Porto Alegre foi mais um personagem do filme, embora a história pudesse ter se passado em qualquer lugar do Brasil, ou, do mundo. As locações são lindas, em especial a Serra Gaúcha, e, o por do sol no Guaíba. Preparem o ouvido para a segunda pessoa, pois, como todos os personagens são gaúchos, o tu é a palavra mais ouvida.
O DVD parece ter sido produzido exclusivamente para o mercado brasileiro. O formato de vídeo é em tela cheia, não existem legendas, e, o áudio vem apenas em português 2.0 e DD 5.1. Sobre o áudio em seis canais, notei que está muito bem distribuído, com todas as caixas atuando. Contudo, o volume estava muito mais alto que a maioria dos filmes, chegando ao ponto de vibrar, anormalmente, aos 30 minutos do filme. Como extras, tem entrevista com o diretor e principais atores, além de notas sobre produção e elenco.
“Tolerância” é um exemplo que espero que fique comum no Brasil, onde temas importantes são tratados com inteligência, e, apresentados num formato que não fica muito longe da qualidade dos que aterrissam por aqui. Vejam e tirem suas próprias conclusões.