Claquete 17 de dezembro de 2004
Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com
Em meio a mil confraternizações, tentando fazer o fígado durar até 2005, um bom programa é conferir os lançamentos nos cinemas. Neste final de semana, estréia a esperada aventura “Capitão Sky e o Mundo de Amanhã”, fantasia estrelada por Jude Law, Gwyneth Paltrow, e, Angelina Jolie, a comédia romântica “Dança Comigo”, com Richard Gere, Jennifer Lopez e Susan Sarandon, “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida”, com a incansável Xuxa, em busca do ouro dos baixinhos, e, a comédia de humor negro “Papai Noel às Avessas”. Continuam em cartaz, o ótimo “Os Incríveis”, parceria da Disney com a Pixar, campeão de audiência nos cinemas americanos, “Lutero”, filme sobre o padre que enfrentou a igreja medieval e provocou a Reforma, as comédias “Bridget Jones, No Limite da Razão”, com Renée Zellweger, “As Branquelas”, dos irmãos Wayans, “A Sétima Vítima”, suspense espanhol, estrelado por Anna Paquin, “O Expresso Polar”, interessante fantasia em animação gráfica, onde o veterano Tom Hanks serviu de modelo para nada menos do que seis personagens, o suspense “Os Esquecidos”, com a talentosa Julianne Moore, e, a comédia romântica “Como Fazer um Filme de Amor”. Em pré-estréia, o desenho “Bob Esponja”, da Nickelodeon. No Filme de Arte, do Cine Natal 1, o documentário, “Super Size me – A Dieta do Palhaço”.
Estréia 1: “Capitão Sky e o Mundo de Amanhã”
Nova York, final dos anos 1930. A repórter Polly Perkins (Gwyneth Paltrow) descobre que os cientistas mais famosos do mundo estão desaparecendo. Após a cidade ser atacada por imensos robôs voadores, ela resolve pedir ajuda ao piloto e aventureiro e seu antigo namorado Joseph “Capitão Sky” Sullivan (Jude Law) e Dex (Giovanni Ribisi), o fiel ajudante dele. A missão principal do grupo é localizar o megalomaníaco doutor Totenkopf (Laurence Olivier), que está escondido em algum lugar do Nepal, de onde planeja destruir o mundo. Destaque para a participação da sempre talentosa Angelina Jolie. Baseando-se em seriados dos anos 40, o diretor Kerry Conran, recriou a Nova York dos anos 30, baseando-se em fotos antigas, e, utilizando computação gráfica. A maior parte do tempo, os atores foram filmados em frente a um fundo azul, substituído, depois, por imagens de computador. O ator Laurence Olivier, que morreu em 1989, foi recriado, a partir de imagens de arquivos, “atuando” como o vilão. “Capitão Sky e o Mundo de Amanhã” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 2, do Moviecom. Para maiores de 12 anos.
Estréia 2: “Dança Comigo”
A crise da meia-idade parece ter chegado, para John Clark (Richard Gere). Apesar de bem-sucedido em seu trabalho, sua vida é monótona, e, o casamento virou uma rotina. Diariamente, ele passa de trem em frente a uma escola de dança de salão, e, sempre vê uma moça da janela. Intrigado, resolve entrar no estabelecimento, para ver como são as aulas. Lá, John conhece uma série de pessoas, e, se interessa especialmente pela bela professora, Paulina (Jennifer Lopez). Após as primeiras aulas, ela avisa o advogado que se estiver lá apenas por sua causa, é melhor desistir de dançar. Encantado com a jovem, John precisa também enfrentar o ciúme de sua mulher Beverly (Susan Sarandon), que coloca um detetive atrás dele, para descobrir quais são suas misteriosas atividades noturnas. Curiosa fábula moderna, sobre as agruras da maturidade, e, as motivações para seguir adiante. Dirigido por Peter Chelson, o filme conta ainda com a veterana Susan Sarandon. “Dança Comigo” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. Censura livre.
Estréia 3: “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida”
Xuxa ataca de Indiana Jones. Bárbara (Xuxa) é uma bióloga tímida, que mora em Beirada D´Oeste, cidade fictícia que beira a floresta Amazônica. Ela lidera uma turma de heróis, que vai parar em Igdrasil, uma cidade subterrânea lendária, povoada por descendentes de vikings, que atravessaram o Atlântico, e, se embrenharam Amazonas adentro. Bárbara enfrenta, ao lado dos pequenos Riacho (Peter Brandão) e Manhã (Bruna Marquezine ), provas perigosas para chegar a Igdrasil, em tempo de salvar a vida de outra criança, e, descobrir quem é a reencarnação de Blomma, uma deusa viking, “padroeira” da cidade perdida. Nesse meio-tempo, Bárbara ainda reencontra Igor (Marcos Pasquim), seu ex-marido, com quem reata o romance interrompido. “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida” estréia nesta sexta-feira, no Cine 4 do Moviecom. Censura livre.
Estréia 4: “Papai Noel às Avessas”
Já imaginaram um Papai Noel falando palavrões, bebendo até encher a cara, e, sem um pingo de paciência com as crianças? Na verdade, “Papai Noel às Avessas” é a história de dois trapaceiros, que se fantasiam de Papai Noel e seu duende, visitando shoppings, para escolher lojas para roubar. A coisa muda de figura quando a dupla se envolve com um garoto de oito anos (Brett Kelly), que, de fato, acha que ele é Papai Noel. A amizade torna Willie, o falso Noel, uma pessoa melhor, embora não o habilite para assumir um papel de anjo. É importante destacar que, “Papai Noel às Avessas” não é um filme para crianças. Para evitar esses erros, teria sido melhor uma tradução literal do título original (“Bad Santa”), ficando algo como “Papai Noel Mau” ou “Mau Velhinho”. Dirigido por Terry Zwigoff (“Mundo Cão”), “Papai Noel às Avessas” não é nada politicamente correto, mas, mesmo assim, não deixa de passar uma bela mensagem natalina. Destaque para a trilha sonora, com as clássicas canções de Natal, como “Jingle Bell Rock”, “Let It Snow, Let It Snow, Let It Snow”, “Jingle Bells”, “Have Yourself a Merry Little Christmas” (cantada por Bing Crosby). Para maiores de 14 anos.
Filme de Arte: “Super Size Me – A Dieta do Palhaço”
O Filme de Arte desta semana traz um curioso documentário, onde o diretor Morgan Spurlock decide ser a cobaia de uma experiência: alimentar-se apenas em restaurantes da rede McDonald’s, realizando neles três refeições ao dia, durante um mês. Durante a realização da experiência, o diretor fala sobre a cultura do fast food nos Estados Unidos, além de mostrar, em si mesmo, os efeitos físicos e mentais, que os alimentos deste tipo de restaurante provocam. O diretor Morgan Spurlock teve a idéia de rodar “Super Size Me” quando, pouco antes do jantar de Ação de Graças, viu, na TV, uma matéria jornalística sobre duas garotas adolescentes, que estavam processando o McDonald’s, por torná-las obesas. A sessão Filme de Arte será no Cine Natal 1, no dia 21, terça-feira, às 21h20.
Pré-Estréia: “Bob Esponja – O Filme”
Em sua estréia nas telas do cinema, o famoso herói da caça quadrada irá viver uma nova e emocionante aventura. Bob Esponja, uma simpática esponja marinha, mora em um abacaxi, no fundo do mar, mais precisamente na Fenda do Biquíni, e trabalha como chapeiro de hambúrgueres de siri, na lanchonete Siri Cascudo, do sovina Sr. Sirigueijo. Em um complicado plano para roubar a fórmula Krabby Patty, Plancton rouba a coroa de Netuno, o governante submarino, e, coloca a culpa no Sr. Siriqueijo. Bob Esponja promete viajar para Shell City com Patrick, para recuperar a coroa. Nesse meio tempo, Plancton contrata Dennis para ajuda-lo a roubar a fórmula Krabby Patty. Pré-estréia neste sábado e domingo, em sessão única, às 17h15, no Cine 7, do Moviecom. Censura livre.
Vagabundo de ouro
Você pagaria 250 mil reais por uma bengala? Pois saiba que alguém o fez, mas não foi uma bengala qualquer. A famosa casa de leilões inglesa, Christie’s, vendeu, na última terça-feira, a bengala que Charles Chaplin, em seu inesquecível personagem Carlitos. Para arrematar a preciosa bengala, no caso, a que foi usada no filme “Tempos Modernos” (Modern Times, 1936), um colecionador pagou nada menos que 47.800 libras, mais de 250 mil reais. Outros dois colecionadores pagaram 17.925 libras (95 mil reais) e 11.950 libras (63 mil reais), por cada um dos bigodes postiços usados no filme “O Grande Ditador” (The Great Dictator, 1940).
Filme recomendado: “Os Implacáveis”
A bela e a fera, de armas na mão
Nos dias de hoje, quando se projeta um grande filme, como “Titanic” ou “Ameaça fantasma”, já estão incluídos, no orçamento, uma maciça campanha publicitária, e, um extensa esquema de distribuição. Isso acontece por ser, este tipo de filme, de consumo imediato. Quando fica “velho”, ou, sai de moda, ninguém se lembra mais deles. Outros filmes, entretanto, podem fazer pouco sucesso nas bilheterias, mas, mantém um público fiel, anos a fio. São classificados, então, como cult movies. O exemplo mais clássico é “Blade runner – Caçador de Andróides”. Um outro, é “Os implacáveis”, sobre o qual iremos conversar.
Esta fita foi produzida em 1972, reunindo três dos maiores ícones do cinema da época: Steve McQueen, Ali MacGraw, e, o diretor Sam Peckinpah. A química do grupo foi tão perfeita que resultou em um filme excepcional. Em 1994, foi feita uma refilmagem, com Kim Basinger, e, o maridão Alec Baldwin. Só para constar nos autos, assim como Basinger, McQueen e Ali MacGraw eram marido e mulher, na época do primeiro filme, e, os seus personagens também o eram.
O enredo do filme é simples, como na maioria dos bons filmes. Um assaltante de bancos, conhecido por “Doc” McCoy, está preso a quatro anos, numa prisão do Texas. Sua mulher, Carol, tenta conseguir sua liberdade condicional, sem sucesso. Orientada pelo marido, procura Jack Beynon, um chefão do crime organizado, que consegue libertar Doc, com a condição que este faça um novo assalto.
Livre da prisão, Doc organiza o assalto, que resulta em duas mortes, e, em uma seqüência de perseguições, confrontos, tiroteios, traições, e, a fuga do casal central. Se eu falar mais alguma coisa, estragarei a surpresa dos espectadores.
O que tornou “Os implacáveis” um filme fora do comum, além da presença do carismático casal central, foi a direção perfeita de Sam Peckinpah. Inimigo do status quo hollywoodiano, ele sempre brigou com os grandes estúdios, que não aceitavam a sua necessidade de independência. Um de seus filmes mais cultuados, “Meu ódio será a tua herança”, foi que disseminou as cenas de violência em câmara lenta, invenção de Peckinpah. Esse artifício é intensamente copiado até hoje, inclusive pelo famoso John Woo, que dirigiu “Missão impossível II”.
Em “Os implacáveis”, Peckinpah consegue dar uma outra dimensão ao suspense cinematográfico. A maioria dos diretores cria o suspense com as cenas do assunto principal, como o assassino que entra na casa e espreita a vítima. Peckinpah por sua vez, usa cenas do cotidiano, para criar a expectativa, usando o tempo real, e, o imaginário, da cabeça do espectador. A sensação chega a ser exasperante, dando vontade de avançar o filme, só para vencer a expectativa.
Outro aspecto interessante deste filme é, como os personagens foram encarnados pelos atores. O assassino Rudy Butler gera uma raiva tão grande, que temos vontade de entrar no filme, e, enchê-lo de balas. Atribuo a isso à direção precisa de Peckinpah, que não deixa nunca o filme perder o ritmo.
O casal central é um espetáculo à parte. O fato de serem casados na vida real talvez tenha ajudado a interpretarem tão bem os McCoy. Aliás, se Steve tinha alguma raiva de Ali, deve ter aproveitado, pois uma das cenas mais marcantes do filme é quando ele esbofeteia a moça, fugindo totalmente do padrão “numa dama não se bate nem com uma flor”…
Ali MacGraw despontara para o sucesso dois anos antes deste filme, com o lacrimejante sucesso “Love story”. Depois de encantar o mundo, vivendo uma mocinha frágil, que morria no final do filme, Ali transveste-se, agora, numa mulher segura, e, decidida, que enfrenta bandidos com a mesma convicção que recebe o marido na saída da prisão. Não podemos esquecer que ela talvez tenha sido a materialização da beleza feminina dos anos setenta: alta, esguia, e, com seus longos e lisos cabelos escuros. Nada a ver com as gordinhas dos sessenta ou com as musculosas dos oitenta.
Steve McQueen era um ator limitado, que não conseguia decorar grandes falas, mas, que exercia um fascínio muito grande sobre o público. Estreando no cinema com um filme B (“A Bolha Assassina”, que hoje é um clássico), logo despertou a atenção da indústria. Nos anos sessenta, participaria de “Sete Homens e um Destino” ( refilmagem de “Os Sete Samurais”, de Kurosawa), “A Grande Escapada” (que foi brilhantemente homenageado, pela animação “A Fuga das Galinhas”), o ótimo “Crown, o Magnífico” (que renderia uma fraca refilmagem com, Pierce Brosnan), e, o clássico “Bullit”.
Depois de “Os implacáveis”, McQueen ainda faria o papel-título de “Papillon”, e, o bombeiro-chefe de “Inferno na Torre”. Com uma vida pessoal atribulada, repleta de romances, carros velozes, motocicletas, álcool, e, cigarros, McQueen parecia uma extensão dos seus personagens mais famosos. Infelizmente, a vida real cobraria o seu preço, e, Steve morreu, de câncer de pulmão, em 1980.
A edição latina de “Os Implacáveis”, em DVD, é de uma pobreza lastimável. Tela cheia, som mono, nenhum extra, está no (baixo) padrão que a maioria das distribuidoras parece ter escolhido para os discos no Brasil. Só o filme em si justifica a aquisição ou aluguel.
Costumo dizer que o que torna um filme uma obra de arte é a forma diferente de contar coisas iguais. “Os Implacáveis” é um filme policial, onde o aspecto mais forte é o relacionamento do casal, onde o ciúme, desejo, fidelidade, e, amor, são os sentimentos mais presentes. Além de ser uma peça cinematográfica precisa, enxuta, e, muito bem conduzida, o diretor consegue mexer com as emoções do público, indignando, e, enternecendo, nas medidas exatas. Experimentem.