Claquete 22 de julho de 2005
Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com
O que está em cartaz
A chuva deu uma trégua, e, a cidade está com cara de férias, embora muitos garotos já tenham voltado às aulas. É uma pena, pois, as estréias da semana estão todas voltadas para o público infantil. De cara, a nova versão de “A Fantástica Fábrica de Chocolates”, dirigida por Tim Burton, e, estrelada por Johnny Depp. De Robert Rodriguez, “As Aventuras de SharkBoy e LavaGirl em 3D”, fantasia, segundo a lenda, baseado em idéias do próprio filho de sete anos do diretor. Por fim, mais uma animação do criador de “A Viagem de Chihiro”, Hayao Miyazaki, “O Castelo Animado”. Continuam em cartaz, “A Queda – As Últimas Horas de Hitler”, narrando os momentos finais do ditador, “Batman Begins”, a nova versão do Homem-Morcego, com Christian Bale, no papel-título, “Guerra dos Mundos”, refilmagem de uma história de H.G.Wells, da dobradinha Spielberg/Tom Cruise, ”Quarteto Fantástico”, novo filme de ação baseado em personagens de quadrinhos, “Sr. e Sra. Smith”, com Brad Pitt e Angelina Jolie, e, “Em Boa Companhia”, com Dennis Quaid. Para a criançada, “Herbie Meu Fusca Turbinado”, o ótimo desenho animado “Madagascar”, da Dreamworks, e, “Pokemón 4 – Viajantes do Tempo”. Não haverá sessão de arte nesta semana.
Estréia 1: “A Fantástica Fábrica de Chocolates”
Um dos filmes que mais encantaram, e, ainda encantam as crianças, “A Fantástica Fábrica de Chocolates”, de 1971, mereceu uma refilmagem, à altura do filme original. Desta vez, o papel de Willy Wonka, vivido magistralmente por Gene Wilder, no primeiro filme, é de Johnny Depp, e, a direção é por conta de Tim Burton. A história é a mesma, em ambos os filmes, baseada no livro homônimo de Roald Dahl. Willy Wonka (Johnny Depp) é o excêntrico dono da maior fábrica de doces do planeta, que, um belo dia, decide realizar um concurso mundial, para escolher um herdeiro para seu império. Cinco crianças de sorte, entre elas, Charlie Bucket (Freddie Highmore), encontram um convite dourado, escondido nas barras de chocolate Wonka, e, com isso, ganham um passeio pela lendária fábrica de chocolate, que não era visitada, por ninguém, há 15 anos. Embora maravilhados com as delícias da fábrica, os visitantes descobrem, a duras penas, que, nem todo mundo merece entrar lá. Uma pitada de cultura inútil: a Nestlé providenciou 1850 barras de chocolate verdadeiro para os sets de filmagens, e, foram usados cerca de 800 mil litros de chocolate falso, para compor o rio de chocolate. “A Fantástica Fábrica de Chocolates” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 6 do Moviecom. Censura livre. Atenção: cópia dublada!
Estréia 2: “As Aventuras de SharkBoy e LavaGirl em 3D”
Max (Cayden Boyd) é um solitário garoto de dez anos, que se perde em seu próprio mundo de fantasia, para escapar das confusões diárias, decorrentes do contato com seus pais, dos valentões da escola, e, de férias de verão, nem um pouco divertidas. Porém, quando Max descobre que os super-heróis que julgava imaginários podem ser bem mais reais do que ele sonhava, seu mundo se transforma completamente. Max, então, parte em uma viagem interplanetária, rumo ao estranho planeta Baba. Lá, ele encontra Sharkboy (Taylor Lautner), um garoto que é metade tubarão, e, metade humano, que foi criado por tubarões após se perder no mar. Ao seu lado está Lavagirl (Taylor Dooley), uma jovem vulcânica, que lança chamas, e, pedras incandescentes. O planeta Baba parece um paraíso infantil, repleto de montanhas-russas gigantescas, e, com um céu violeta, mas, o lugar enfrenta uma perigosa ameaça: o Sr. Elétrico (George Lopez), que tem, por objetivo, acabar com os sonhos das crianças, para sempre. Com Sharkboy, e, Lavagirl, em perigo, cabe a Max salvá-los, tendo que usar sua imaginação para conseguir derrotar o Sr. Elétrico. O roteiro do filme foi baseado nas aventuras intergalácticas criadas por Racer Max Rodriguez, filho do diretor Robert Rodriguez, de apenas 7 anos. “As Aventuras de Sharkboy e Lavagirl em 3-D” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 4 do Moviecom. Censura livre. Atenção: cópia dublada!
Estréia 3: “O Castelo Animado”
Em meio à mesmice das produções infantis, um desenho japonês chega aos nossos cinemas, tendo, como maior referência, o diretor Hayao Miyazaki, que já nos brindou com os belíssimos “Princesa Mononoke” e “A Viagem de Chihiro”. O filme atual conta a história de Sofia, uma jovem de 18 anos, que trabalha na chapelaria de seu pai. Em uma de suas raras idas à cidade, ela conhece Hauru, um mágico bastante sedutor, mas, de caráter duvidoso. Ao confundir a relação existente entre eles, uma feiticeira lança sobre Sofia uma maldição, que faz com que ela aparente 90 anos. Desesperada, Sofia foge, e, termina por encontrar o Castelo Animado de Hauru. Escondendo sua identidade, ela consegue ser contratada, para realizar serviços domésticos no local. Aos poucos, vai se envolvendo com os demais moradores do castelo, em especial com Karushifã, um ser que vive no fogo, que também foi amaldiçoado, e, por isso, eles fazem um pacto para se ajudarem. “O Castelo Animado” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. O filme terá apenas uma sessão diária, sempre às 12h50. Censura livre. Atenção: cópia dublada.
“Meu Tio Matou Um Cara”, em DVD
Lá do sul, da Casa de Cinema de Porto Alegre, chega mais uma boa produção nacional, agora no formato digital. Éder (Lázaro Ramos) é preso, ao confessar ter matado um homem. Duca (Darlan Cunha), um menino de 15 anos, que é sobrinho de Éder, quer provar a inocência do tio. Ele tem certeza que o tio está assumindo o crime para livrar a namorada, Soraya (Deborah Secco), ex-mulher do morto. Duca também quer conquistar o coração de Isa (Sophia Reis), uma colega de escola que parece estar mais interessada em seu melhor amigo, Kid (Renan Gioelli). Para conseguir provar sua teoria, Duca recebe a ajuda de Isa, e, Kid, nas investigações. Um texto inteligente, boa atuação do elenco, e, a direção segura de Jorge Furtado, garantem uma boa diversão. A trilha sonora foi produzida por Caetano Veloso e André Moraes. Já nas locadoras.
“Em Boa Companhia”
Dan Foreman (Dennis Quaid) é o chefe de vendas de publicidade da revista Sports América, e, aos 51 anos, leva uma vida tranqüila. Mas, após a revista ser adquirida pela multinacional Globecom, Dan perde sua função, na empresa, para o jovem Carter Duryea (Topher Grace), um ambicioso publicitário de 26 anos. Em casa, Dan enfrenta, ainda, novos problemas, com a inesperada gravidez de sua esposa, e, os gastos extras, com as faculdades de suas filhas, Alex (Scarlett Johansson), e, Jana (Zena Grey). Por causa das novas despesas, Dan não pode, de maneira alguma, perder seu atual emprego, e, tenta, de todas as formas, manter um clima amigável com o intragável Carter. Mas, a situação muda de figura, quando Carter, que se divorciou recentemente, começa a namorar Alex. “Em Boa Companhia”, com direção de Paul Weitz, está em cartaz no Cine 5 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.
“Vozes do Além”, em DVD
O suspense sobrenatural “Vozes do Além” parte de uma prática espírita Electronic Voice Phenomenon (Fenômeno da Voz Eletrônica – FVE), para contar uma história de terror, com toques de romance. Esse fenômeno baseia-se na comunicação que os mortos tentam fazer, com os vivos, usando aparelhos eletrônicos, como televisores, e, rádios. Jonathan Rivers (Michael Keaton) é um arquiteto, que fica viúvo, quando sua segunda esposa morre, em um misterioso acidente. Ele tenta seguir a vida, mas, não consegue. Um dia, conhece um estranho, que diz que a falecida está se manifestando usando o EVP. Rivers não acredita nisso, mas, quando faz o primeiro contato com sua mulher, fica fascinado. A partir daí, passa a estudar o fenômeno, e, se comunicar, com freqüência, com sua mulher. Ela começa a lhe dar pistas, para ajudar pessoas. Mas, algo de estranho acontece, pois ele começa a ouvir vozes de pessoas que ainda estão vivas, ma, que morrerão, em breve. Rivers tenta de tudo, para ajudá-los, mas, espíritos do mal vão impedi-lo. O disco traz a imagem em widescreen anamórfico, e, como extras, os documentários “Fazendo Contato: Experimentos de FVE”; “Como Gravar FVE, a Vida após a Morte”; “Ouvir é Acreditar: Sessões Reais de FVE”, comentários do diretor e de Michael Keaton; cenas excluídas. Já nas locadoras.
Abertas inscrições para o Festival do Minuto Vivo
Estão abertas, até o dia 31 de julho, as inscrições para o Festival do Minuto Vivo. O tema deste ano é “Silêncio”. Os concorrentes podem enviar obras realizadas em qualquer tipo de equipamento que produza imagens em movimento: câmeras de vídeo, câmeras de aparelhos de celular, câmeras de foto digital (inclusive seqüências de fotos) ou animações em formato Flash, feitas em computador. Para efeito de inscrição, os trabalhos podem ser entregues em fita de vídeo VHS, mini-DV, ou, ainda, em CD. Os trabalhos devem ter no mínimo um frame, e, no máximo, 60 segundos, incluídos os créditos. A cada bimestre, três trabalhos recebem premiação de mil reais, além do Troféu Minuto, e, de um curso de computação gráfica e vídeo digital. Informações no site www.festivaldominuto.com.br/.
Filme recomendado: “Tango”
O vôo de Saura, nas plagas de Gardel
Será que poderíamos imaginar algum cineasta estrangeiro, vindo ao Brasil para fazer um filme sobre o samba? No entanto, o diretor espanhol atreveu-se a tarefa semelhante, indo filmar, na Argentina, uma produção sobre o tango, e, toda a sua presença na história e cultura portenha. Fugindo de uma narração tradicional, o diretor conseguiu passar, pelo menos para os não-argentinos, a sensação de ter cumprido a missão a contento. O filme é “Tango”, de 1998.
Como falar de um valor cultural argentino, que não apenas embala a vida de seus habitantes, mas entranha-se em suas emoções, boas e más, sensuais ou dolorosas, sempre a dois, num estranho jogo de movimentos, desigualmente simétricos, tanto quanto o homem e a mulher que o interpretam?
Ao invés de um roteiro linear e tradicional, Saura optou por uma linha tênue e sinuosa, vagamente conduzida por um personagem central, Mario Suarez (Miguel Ángel Sola), autor e diretor teatral. Mário, apesar da fama, está em crise. Toda uma carreira gloriosa ficou para trás, e, ele, agora, depara-se com vários fantasmas, que o atormentam. A mulher, principal estrela do filme que está produzindo, o abandonou, reconstruindo sua vida com outro companheiro. A saúde é precária, pois um grave acidente de carro quase o fez perder a perna. A idade o lembra de que não é mais jovem, não lhe restando mais tanto tempo para a vida aventureira que sonhara. E, a mais triste das maldições: a inspiração parece ter se perdido, em meio a tantas crises convergentes.
Apesar de tudo, Mário é querido por seus amigos e companheiros, que procuram ajuda-lo, através de seu filme, a reencontrar a paz de espírito. A produção, sobre o tango, leva-o a paraísos de Buenos Aires, onde a arte mostra o seu valor, através de velhos, jovens, e, crianças, que mantêm viva a beleza da dança.
Numa destas visitas, encontra-se com Angelo Larroca (Juan Luis Galiardo), um mafioso que patrocina a maior parte do filme de Mário. Ele pede a Mario que dê um papel, no filme, à sua protegida, Elena (Mía Maestro), uma jovem e bela bailarina. Incerto, a princípio, aos poucos, Mário fica impressionado com o talento e beleza da jovem. Não tarda muito, para que se tornem amantes, a despeito dos avisos de todos.
Algumas partes da história Argentina são encenadas através da dança, como a chegada dos imigrantes, no final do século XIX, ou, a repressão militar do século XX. Em todas, a presença do tango era constante, até mesmo para abafar os gritos dos torturados, como afirma um dos personagens.
Na apoteótica chegada dos imigrantes, que se rendem à bela dança portenha, um vulto malévolo esgueira-se entre os dançarinos. Um punhal é brandido, em direção à bela Elena, que cai, o sangue manchando a sua roupa. O diretor corre em sua direção, apavorado. Terá sido esta a vingança do mafioso? Para saber mais, assista ao filme.
Com um roteiro quase inexistente, e, pouquíssimas personagens, Saura utilizou outros elementos, para compor o quadro completo de “Tango”. Tendo, à sua disposição a fina flor dos músicos, atores, e, bailarinos argentinos, não foi preciso ir muito além. Numa bela utilização de metalinguagem cinematográfica, Saura confere, ao seu diretor-personagem, o poder de apresentar belas referências a grandes nomes do tango, como Carlos Gardel e Astor Piazzola. Através das fantasias de Mário, é possível ter várias visões da dança, que vão, de um sensual embate entre sua antiga e atual amadas, até a exibição de “La Cumparsita”, certamente o mais conhecido e tocado tango, qualquer que seja o lugar no mundo.
Com uma trilha sonora maravilhosa, criada sob a batuta do argentino Lalo Schiffrin, e, a fotografia estudada, do fotógrafo italiano Vittorio Storaro, Saura nos presenteia com uma serie de quadros, onde a batida forte da música embala os sensuais movimentos dos casais.
Originariamente, o tango nasce no final do século XIX, de uma mistura de vários ritmos, provenientes dos subúrbios de Buenos Aires. Esteve associado, desde o princípio, com bordéis e cabarés, âmbito de contenção da população imigrante, massivamente masculina. Devido a que só as prostitutas aceitariam esse baile, em seus começos, era comum que o tango fosse dançado por um casal de homens.
Mas, o tango, como dança, não se limitou às zonas baixas, ou, a seus ambientes próximos. Estendeu-se também aos bairros proletários, e, passou a ser aceito “nas melhores famílias”, principalmente depois que a dança teve sucesso na Europa.
O DVD, distribuído no Brasil pela Europa, não manteve o formato da edição americana, e, prejudicou a maravilhosa fotografia do filme. Mas, o som oferece as opções português e espanhol (Dolby Digital 5.1 e 2.0). Como extras, notas sobre a produção e elenco, e, um making of, legendado, além de trailer de cinema.
Este filme, que mereceu o prêmio técnico de Cannes em 1998, além da indicação ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro de 1999, certamente irá agradar a maioria das pessoas, que sentem prazer com a música e a dança. Diferente dos enfadonhos musicais de Hollywood, em “Tango”, nada é gratuito, e, mesmo sendo uma colcha de retalhos, é uma bela coleção de retalhos de imagens e sons que irão permanecer em suas mentes, mesmo depois de desligar a tv. Experimentem.