Série da Semana: “Sol da Meia-noite” (“Midnattssol”)

Há muito que venho chamando a atenção dos meus leitores em relação às produções escandinavas, filmes para televisão e cinema, e séries, todos com um padrão de qualidade que não fica a dever para qualquer outro país do mundo. E é nesse padrão que foi feita a minissérie “Sol da Meia-noite” (“Midnattssol”, Suécia, 2016).

É possível que este título tenha evocado a lembrança de um filme homônimo, de 1985, estrelado pelo bailarino Mikhail Baryshnikov. O ponto em comum se resume ao título e à região geográfica, o Círculo Polar, um lugar tão ao Norte da Terra, que durante o verão, o sol não se põe.

Na produção sueca, a história acontece em uma remota região do norte da Suécia. Um cidadão francês é assassinado de forma cruel e estranha, amarrado na pá de um helicóptero, sendo praticamente despedaçado pela rotação do veículo.

Quem assume o caso é o policial Rutger Burlin (Peter Stomare), que convoca o promotor Anders Harnesk (Gustaf Hammarsten) para conduzir a parte legal. Como se trata de um cidadão francês, a polícia francesa é comunicada através dos canais diplomáticos, e a policial Kahina Zadi (Leila Bekthi) é enviada para a Suécia para acompanhar as investigações.

Tudo parece estranho desde o início. A vítima parece não ter identidade nem na Suécia nem na França. Logo são descobertos mais pessoas assassinadas, sempre de forma cruel, e uma lista de 22 pessoas parece ser o elo de ligação entre todos.

Contudo, na pequena cidade em que todos habitam, as mortes despertam um sentimento de ira contra a minoria étnica Sami, os habitantes originários da região, que são jocosamente chamados de lapões, e são historicamente desprezados pelos suecos “puros”. Essa etnia vivia em toda a parte norte da Suécia, Noruega, Finlândia e península Kola, da Rússia.

Ao longo dos oito episódios da série, novos acontecimentos provocam o envolvimento entre os personagens e levantam dúvidas sobre as razões que teriam motivado todos aqueles assassinatos.

Diferentemente de outras tantas séries que vemos, com mocinhos virtuosos e vilões maléficos, aqui todos tem defeitos e qualidades, além de sombras no passado. A policial Kahina foi mãe ainda adolescente, e abandonou o filho com a mãe, jamais voltando a reencontrar a família. O promotor Anders é gay mas não consegue assumir, é tímido e confuso, além de ser mestiço de mãe Sami e pai sueco, o que o coloca em grande problema no meio em que vive.

Esta série levanta questões interessantes sobre o racismo na Suécia, um país considerado como um dos melhores do mundo para se viver. Assim como a trilogia Millenium, do escritor Stieg Larsson, que denunciou a violência doméstica e o neonazismo na Suécia, “Sol da Meia-noite” revela os problemas da etnia Sami, cujas terras foram invadidas e depredadas em busca de minérios e outras fontes de riqueza.

Ao longo de séculos, da mesma maneira que aconteceu no Brasil, Canadá e outros países, os nativos foram enganados, espoliados, massacrados e vivem à margem da sociedade “normal”. Durante o processo, os xamãs Sami chegaram a ser queimados na fogueira como hereges. Alguns dos personagens evocam este lado místico da cultura escandinava, muito frequente nas produções da região.

A série consegue mostrar essa dualidade de comportamento sem tomar partidos ou vitimar os Sami. E mostra ainda que mesmo em um dos países menos corruptos do mundo ainda podem acontecer atos horríveis motivados pelo dinheiro.

Diferente dos outros seriados onde o herói resolve tudo na bala, “Sol da Meia-noite” mostra que somos todos sujeitos a paixões, fraquezas, idealismos e firmeza de propósitos. Ou seja, humanos.

Título Original: “Midnattssol”