Claquete 21 de outubro de 2005

Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com

O que está em cartaz

A Natureza continua mandando avisos aos que maltratam o planêta, mas, parece que os recados não chegam aos destinatários corretos. Enquanto isto, no Brasil, estaremos decidindo se só os bandidos terão direito a comprar armas… melhor ir ao cinema, pois neste final de semana estréiam a animação “A Noiva Cadáver”, do diretor Tim Burton, e, “Carga Explosiva 2”, filme de ação com Jason Statham. Continuam em cartaz, “O Jardineiro Fiel”, primeiro filme internacional do brasileiro Fernando Meirelles, o besteirol “Gigolô Europeu por Acidente”, “O Coronel e o Lobisomem”, com Diogo Vilela e Selton Mello, “Os Irmãos Grimm”, fantasia unindo os criadores de contos de fadas e suas criações, “2 Filhos de Francisco”, cine-biografia da dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano, representante brasileiro no Oscar, a comédia romântica “A Feiticeira”, com Nicole Kidman, e, “Wallace & Gromit – A Batalha dos Vegetais”, excelente animação, dos mesmos criadores de “A Fuga das Galinhas”.


Estréia 1: “A Noiva Cadáver”

Em um vilarejo europeu, no século XIX, vive o jovem Victor Van Dorst (Johnny Depp), que está preste a se casar com Victoria Everglot (Emily Watson). Porém, acidentalmente, Victor se casa com a Noiva-Cadáver (Helena Bonham Carter), que o leva para conhecer a Terra dos Mortos. Desejando desfazer o ocorrido, para poder, enfim, se casar com Victoria, aos poucos, Victor percebe que a Terra dos Mortos é bem mais animada do que o meio vitoriano em que nasceu e cresceu. O filme é uma animação, usando a técnica stop-motion. O diretor Tim Burton é autor de filmes que fogem ao tradicional, como “Edward Mãos de Tesoura”, “Marte Ataca!”, e, o recente “A Fantástica Fábrica de Chocolates”. Além das vozes dos atores citados acima, também estão, no filme, Albert Finney, Richard E. Grant, e, Christopher Lee. “A Noiva Cadáver” estréia nesta sexta-feira, no Cine 4 do Moviecom. A censura é livre, mas, a cópia é legendada.

Estréia 2: “Carga Explosiva 2”

Frank Martin (Jason Statham) é um ex-agente das Forças Especiais, que trabalha como transportador de itens valiosos. Frank, atualmente, trabalha para a poderosa família Billings, como favor a um amigo. Aos poucos, ele fica íntimo do pequeno Jack Billings (Hunter Clary), de seis anos, a quem leva, e, traz da escola. Mas quando Jack é seqüestrado, Frank tem de usar os seus conhecimentos aprendidos no exército, para recuperar o menino, e, impedir o perigoso plano dos seqüestradores, que querem espalhar um perigoso vírus, que pode matar ao simples contato. Este filme é a seqüência de “Carga Explosiva”, exibido segunda passada, na Globo. O roteiro e a produção têem a participação de Luc Besson, o que garante uma boa dose de explosões, tiros, perseguições espetaculares, e, muitas lutas acrobaticas. “Carga Explosiva 2” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. Para maiores de 14 anos.

“Nicotina”, em DVD

Lolo (Diego Luna) é um hacker, que tem um caso com sua vizinha, e, inquilina, a violoncelista Andrea (Marta Belaustegui). Lolo é especialista em tecnologia de ponta, e, usando seu talento, grava todas as ligações telefônicas de Andrea, e, a espiona, através de câmeras escondidas. Paralelamente ele consegue acessar dados de contas suíças através do computador, os quais usa, juntamente com dois criminosos, como trunfo, para negociar com um mafioso russo, por 20 diamantes. Quando Andrea descobre que está sendo espionada, e, que Lolo é o culpado, ela invade o apartamento dele, e, quebra tudo o que vê, arremessando o CD com os dados das contas suíças pela janela. Sem saber, Lolo pega o CD errado, e, o entrega aos mafiosos. Com o fracasso da troca, todos partem pelas ruas da Cidade do México, para encontrar o CD perdido. Este curioso filme mexicano ocorre em tempo real, tendo início às 9h17, e, terminando às 10h50. A direção é de Hugo Rodriguez. A edição é pobre: formato de tela fullscreen, áudio em espanhol e português 2.0, sem nenhum extra.

“A Casa de Cera”, em DVD

Carly (Elisha Cuthbert), Paige (Paris Hilton), Wade (Jared Padalecki), Nick (Chad Michael Murray), e, mais dois amigos, decidem viajar de carro, para o maior campeonato universitário de futebol americano a ser realizado no ano. Durante a viagem, eles decidem acampar, à noite, planejando seguir pela manhã. Um acidente com um motorista de caminhão assusta o grupo, que, no dia seguinte, descobre que o carro deles fora danificado. Sem saída, eles aceitam uma carona até Ambrose, a cidade mais perto do local. Ao chegar, o grupo fica impressionado com a Casa de Cera de Trudy, a principal atração de Ambrose, que possui várias estátuas de cera, muito parecidas com pessoas de verdade. Porém, o que eles não sabem é o motivo pelo qual as estátuas parecem tão reais. O disco traz formato de tela widescreen anamórfico, som Dolby Digital 5.1, e, como extras, Comentários do elenco, documentários “Com Brilho”, e, “Casa feita de Cera – Making Of da produção”, Erros de Gravação, Início alternativo – Jennifer é morta, e, Trailer de Cinema. Nas locadoras.
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Cineclube Natal promove sessão na próxima terça-feira

O Cineclube Natal promoverá uma sessão do filme coreano “Old Boy”, do diretor Park Chan-wook. Oh Dae-su (Choi Min-sik) é um homem comum, bem casado, e, pai de uma garota de três anos, que é levado a uma delegacia, por estar alcoolizado. Ao sair, ele liga para casa, de uma cabine telefônica, e, logo em seguida, desaparece, deixando como pista apenas o presente de aniversário que havia comprado para a filha. Pouco depois, ele percebe estar em uma estranha prisão, um quarto de hotel, onde há apenas uma TV ligada, no qual recebe pouca comida na porta, e, respira um gás, que o faz dormir diariamente. Através do noticiário da TV, ele descobre que é o principal suspeito do assassinato brutal de sua esposa, o que faz com que tente o suicídio. Sem obter sucesso, ele passa a se adaptar à escuridão de seu quarto, e, a preparar seu corpo e sua mente para sobreviver à pena que está sendo obrigado a cumprir, sem saber o porquê. Este filme ganhou o Grande Prêmio do Júri, no Festival de Cannes. Na próxima terça-feira, dia 25, no Teatro da Cultura Popular, na rua Jundiaí, às 19h.

Ronald Golias, em DVD

A distribuidora Europa Filmes lança, este mês, o primeiro pacote de DVDs da Coleção Herbert Richers, com filmes da década de 50 e 60 produzidos por Herbert Richers. Entre os três primeiros títulos lançados está “Golias Contra o Homem das Bolinhas”, de 1969. Por coincidência, também soa como uma homenagem a Ronald Golias, falecido final do mês de setembro. Augusto tem 40 anos, e, mora com sua esposa chata, os sogros e um cunhado folgado. Seduzido pela beleza da loira Arlete, resolve visitá-la, usando uma gravata de bolinhas. Mas, a visita acaba tornando-se a maior enrascada de sua vida, quando descobre que ela foi assassinada. Pior: Augusto é o principal suspeito. Ele deve se livrar, não somente da acusação, mas, também, de Pacífico, vivido por Golias. No elenco, Íris Bruzzi, Otelo Zeloni, Zilda Cardoso, Darlene Gloria, e, muitos outros.

Filme recomendado: “O Jardineiro Fiel”

Remédios caros, vidas baratas…

Com a proximidade da votação do referendo sobre a comercialização de armas, comecei a procurar um filme sobre o qual pudesse desenvolver o tema. Afinal de contas, é a minha obrigação, como jornalista, tentar esclarecer os leitores, e, o meio que utilizo, a linguagem simbólica do cinema. Depois de pensar em muitos títulos de tiros e guerras, encarei o óbvio: o melhor exemplo estreou a semana passada nos cinemas, “O Jardineiro Fiel”, primeiro filme internacional do diretor brasileiro Fernando Meirelles.

Talvez os leitores estranhem, já que está se debatendo armas, enquanto o filme trata da corrupção da indústria farmacêutica. Não se enganem, meus caros leitores, muda o objeto, mas, permanece o meio, a política de desinformação, para atingir lucros, ao custo da vida de inocentes.

O filme é baseado em um livro de John Le Carré, autor de best sellers complexos e intrigantes, muito distantes das tramas fáceis, dos heróis superpoderosos, que passeiam no luxo do jet set internacional.

“O Jardineiro Fiel” trata da vida de duas pessoas, aparentemente díspares, mas, muito enamoradas. Tessa (Rachel Weisz) é uma jovem ativista americana, atrevida, e, desbocada, que, ao assistir a palestra de um diplomata inglês, questiona-o duramente sobre a entrada da Inglaterra no Iraque, como se ele tivesse dado a ordem a Tony Blair. Confuso, Justin Quayle (Ralph Fiennes), sente-se intimidado, e, ao mesmo tempo, atraído pela ousada moça. Não demora a surgir uma atração entre os dois, que descamba em um relacionamento mais permanente.

Quando Justin é designado para servir no Quênia, Tessa insiste para que ele a leve consigo, já que a África era o sonho de consumo para os trabalhos humanitários da jovem. Os dois se estabelecem no país africano, e, enquanto o homem cumpre a burocracia e preocupa-se com as plantas do jardim, sua mulher enfronha-se em trabalhos voluntários numa ONG, que ajuda pessoas com AIDS e tuberculose, sempre ao lado do médico belga Arnold, o melhor amigo dela.

Aos poucos, pequenos sinais que indicariam a infidelidade de sua mulher, além de um isolamento cada vez maior dela, preocupam Justin, que prefere ignorar tudo, em função do amor que sente por ela, e, do filho que está por nascer.

Mesmo passando pela tragédia pessoal de perder o filho recém-nascido, Tessa continua investigando as atividades de empresas farmacêuticas, que distribuem remédios nas favelas do país. Essa fixação preocupa o marido e os amigos, já que a moça desafia autoridades locais e inglesas, causando embaraços sociais enormes.

Certo dia, Tessa viaja ao interior do país, como sempre, acompanhada por Arnold. Ao despedir-se da mulher, no aeroporto, Justin não tem idéia de que será a última vez que a vê com vida. Alguns dias depois, a mulher é encontrada morta, numa região remota, ao lado de um desconhecido, enquanto Arnold desaparece completamente.

Atordoado, Justin tenta encontrar uma razão para a morte da mulher, já que, a versão oficial, de crime passional, não é admissível, para ele. Aos poucos, ele vai construindo, como em um quebra-cabeças, o mistério que ela investigava, para, então, chegar aos autores de sua morte.

Tudo, e, todos, parecem conspirar contra ele. A corrupta polícia queniana levanta suspeitas de que ele seria o mandante do crime, enquanto o seu próprio governo confisca o seu passaporte. Ligando todas as peças, como a cuidadosa teia de aranha, estava uma poderosa multinacional farmacêutica, que testava um novo medicamento na população miserável do país africano.

Aonde Justin chega, as mãos do poder chegaram primeiro, assaltando, ameaçando, explorando, espancando. O único aliado que segue ao seu lado é o primo de Tessa, com que a moça trocava extensa correspondência pela internet, criando um backup que seria o seu legado.

Após muitas investigações e sofrimentos, Justin descobre que terá que voltar até o ponto de partida, para encontrar as respostas a todas as perguntas, e, finalmente, poder voltar para casa, que ele chamava de Tessa. Ponto. Para saber mais, assista ao filme.

O espectador certamente estranhará a ótica pessimista, que mostra a luta inglória, do indivíduo contra o sistema. Mas, isso faz parte do estilo de Carré, muito diferente dos heróicos 007 da vida.

Meirelles, com o roteiro bem amarrado de Jeffrey Caine, e, a fotografia maravilhosa de César Charlone (o mesmo de “Cidade de Deus”), conseguiu traduzir, para o universo do cinema, as seiscentas páginas do livro de Carré, condensando-as magnificamente em pouco mais de duas horas de filme.

A história não corre linear, mas, sim, inicia pelo assassinato, e, prossegue com a investigação de Justin, entremeada por flashbacks que ajudam, não só, a definir a personagem morta, mas, também, a trazer o espectador como cúmplice das descobertas que levam à elucidação do mistério.

E, dirá o leitor, com toda razão, o que tem isto a ver com o nosso referendo de domingo? O pecado mostrado no filme é o da ganância, que, para ser satisfeita, precisa ser justificada com mentiras, estatísticas, que escondem – literalmente – vidas humanas perdidas, nos efeitos colaterais das drogas testadas.

Como disse um ex-ministro, ainda no pleno exercício de suas funções, “o que é bom, a gente mostra, o que é ruim, a gente esconde”. Seja na ficção, com os resultados negativos dos testes, seja na vida real, com as estatísticas confusas, e, mal explicadas, a que os brasileiros tem sido bombardeados, fica a pergunta: o que é real?

O filme mostra os pequenos heróis, Tessa, Justin, Arnold, lutando como quixotes modernos, investindo contra os poderosos moinhos impenetráveis dos governos e corporações, sacrificando-se, como modernas joana darcs, sempre em busca da verdade.

É na busca dessas verdades ocultas que precisamos nos esforçar, fugindo dos chavões e frases feitas, das mentiras ilusórias, que prometem paz onde ela não poderá ser encontrada, desviando a atenção de problemas muito mais sérios, que ameaçam, não só, a nossa vida atual, mas, também a sociedade, a vida, e, o país, que iremos legar aos nossos filhos.