Claquete 11 de fevereiro de 2005

Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com

O que está em cartaz

Depois de viver as folias das Virgens de Pirangi, ou dos Cão da Redinha, o bom mesmo é recuperar-se com um bom cinema. Para isso, estréiam, neste final de semana, dois pesos-pesados, concorrentes ao Oscar: “Menina de Ouro”, dirigido e estrelado pelo ótimo Clint Eastwood, e, “O Aviador”, de Martin Scorsese, estrelado por Leonardo DiCaprio. Nas continuações, títulos para todos os gostos e idades. Para os que gostam de ação e terror, tem o polêmico “Alexandre”, de Oliver Stone, com direito a muitas batalhas e beijos, “Elektra”, com Jennifer Garner, revivendo o seu personagem de “Demolidor”, o suspense “O Grito”, remake de um famoso filme japonês, e, “Jogos Mortais”, um terror psicológico vindo do cinema independente. Para os amantes das comédias, o besteirol “Entrando Numa Fria Ainda Maior”, que tem, como maior mérito, reunir Robert de Niro, Dustin Hoffman, e, Barbra Streisand, na mesma tela. Para quem curte drama, vale ver “Perto Demais”, com Julia Roberts, e, Natalie Portman, que confirma o seu talento dramático, e, o surpreendente “Em Busca da Terra do Nunca”, drama estrelado por Johnny Depp, que vive o criador de Peter Pan. Para a gurizada, além de “Desventuras em Série”, com o camaleônico Jim Carrey, tem as produções nacionais “Tainá 2 – A Aventura Continua”, e, “Eliana em O Segredo dos Golfinhos”, com a apresentadora infantil Eliana. Finalmente, para o pessoal que curte um cinema de arte, a volta do Filme de Arte do Cine Natal 1, traz a produção franco-canadense “Tirésia”. E, viva! Finalmente, começamos 2005, para valer!

Estréia 1: “Menina de Ouro”

Frankie Dunn (Clint Eastwood) passou a vida nos ringues, tendo agenciado, e, treinado, grandes boxeadores. Frankie costuma passar, aos lutadores com quem trabalha, a mesma lição que segue para sua vida: antes de tudo, proteja-se! Magoado com o afastamento de sua filha, Frankie é uma pessoa fechada, tendo, como único amigo, o velho Scrap (Morgan Freeman), que cuida também de seu ginásio. Um dia, surge, em sua vida, Maggie Fitzgerald (Hilary Swank), uma jovem determinada, que possui um dom, ainda não-lapidado, para lutar boxe. Maggie quer que Frankie a treine, mas, ele não aceita treinar mulheres, além de achar que ela está velha demais para iniciar uma carreira no boxe. Apesar da negativa de Frankie, Maggie decide treinar diariamente no ginásio, com Scrap, que a encoraja a seguir adiante. Vencido pela determinação de Maggie, Frankie, enfim, aceita ser seu treinador. Os dois iniciam uma dolorosa e trágica história de amor. Consagrado pela crítica e pelo público, o filme, dirigido pelo próprio Clint Eastwood, mereceu sete indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator (Clint Eastwood), Melhor Atriz (Hilary Swank), Melhor Ator Coadjuvante (Morgan Freeman), Melhor Edição, e, Melhor Roteiro Adaptado. “Menina de Ouro” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.

Estréia 2: “O Aviador”

Se alguém já mereceu ter a sua vida levada às telas, sem dúvida alguma, este alguém seria Howard Hughes, não apenas por sua ligação com o cinema, como, também, por suas aventuras no campo da aviação. Mas, o que mais marcou a vida de Hughes foram as excentricidades, que beiravam a loucura, só toleradas porque o homem era um milionário. Entre estas aventuras, houve a construção de um avião, tão gigantesco, que, simplesmente não conseguia levantar vôo! O filme, dirigido pelo diretor Martin Scorsese, aborda sua vida entre os anos 20 e 40, iniciando em 1930, durante a produção do filme “Hell´s Angels”. Howard tinha apenas 18 anos, quando herdou 75% das ações da empresa Hughes Tool Co, uma das gigantes do setor petrolífero. Pouco tempo depois, ele mudou-se para Los Angeles, onde se tornou produtor de cinema, influenciando a carreira de estrelas como Jean Harlow (Gwen Stefani), Katharine Hepburn (Cate Blanchett) e Ava Gardner (Kate Beckinsale). Vivendo numa fase histórica, onde a indústria da aviação teria um impulso tremendo, principalmente devido ao esforço de guerra, Hughes tornou-se um dos homens mais poderosos dos Estados Unidos. No filme, o milionário é vivido por Leonardo DiCaprio, que foi indicado ao Oscar de Melhor Ator. “O Aviador” foi indicado para mais dez premiações do Oscar, entre elas, a de Melhor Filme e Diretor. Também atuam, no filme, Jude Law, Alec Baldwin, Willem Dafoe, e, Alan Alda. “O Aviador” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 6 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.

Filme de Arte: “Tirésia”

De volta à vida, a sessão Filme de Arte, do Cine Natal 1, traz a produção franco-canadense “Tirésia”. Na mitologia grega, Tirésia é, ao mesmo tempo, mulher, e, homem. Neste filme, é uma transexual brasileira, que vive na clandestinidade, com o irmão, na periferia de Paris. Terranova é um admirador da estética, um sonhador cheio de idéias poéticas. Comparando Tirésia a uma rosa perfeita, ele resolve seqüestrá-la. Sem sua dose regular de hormônios, Tirésia começa a transformar-se, pouco a pouco: a barba cresce, a voz muda. Desgostoso, Terranova cega Tirésia, abandonando-a no campo. Em estado lastimável, ela é recolhida por Anna, que ajuda em sua recuperação. À medida que melhora, Tirésia começa a manifestar dons de premonição. Dirigido por Bertrand Bonello , o filme Concorreu à Palma de Ouro de Melhor Filme, no Festival de Cannes, onde causou estranheza, por mostrar a bela atriz brasileira, Clara Choveaux, de barba, manipulando um pênis postiço, e, sendo duramente espancada. “Tirésia” terá sessão única, às 21h do dia 15, terça-feira, no Cine Natal 1. Para maiores de 18 anos.

“Rei Arthur”, em DVD

A lenda do Rei Artur, e, seus Cavaleiros da Távola Redonda, está, mais uma vez, em evidência. Desta vez, no lançamento do DVD, na “montagem do diretor”, com 15 minutos a mais do que a versão exibida nos cinemas. A história de Artur, agora ambientada nos anos finais de ocupação romana da Bretanha, atual Inglaterra, mostra o jovem rei, cercado por seus fiéis guerreiros, combatendo os invasores do continente. Para isso, ele conta também, com a ajuda de um líder local, Merlin, e, de uma bela guerreira, Guinevere. Mas, não espere mudanças na trama mostrada nos cinemas. Os minutos adicionais devem-se às cenas de batalha, mais longas e intensas, com lances de violência que foram censurados para a versão da telona. O filme traz o áudio em inglês, português, e, espanhol, em Dolby Digital 5.1, além de manter o formato de tela widescreen original, com opção anamórfica. Como extras, Galeria de fotos, o documentário “Sangue na Terra: Forjando Rei Arthur”, e, Final Alternativo, comentado pelo diretor Antoine Fuqua (“Dia de Treinamento”).

Desventuras no PC

A exemplo de “Alexandre”, como foi noticiado nesta coluna, mais um filme ganha versão em game. O jogo “Lemony Snicket” é inteiramente inspirado na popular coleção literária “Desventuras em Série”, que já vendeu mais de 15 milhões de volumes ao redor do mundo. Como no filme, os irmãos Baudelaire são obrigados a passar por muitas dificuldades, para enfrentar o malvado conde Olaf. São mais de 20 missões de exploração, onde o jogador tem controle total sobre os três personagens, cada um com habilidades únicas. Violet Baudelaire é uma grande inventora, Klaus tem uma memória fantástica, e, o bebê Sunny possui quatro dentes muito afiados, capazes de romper qualquer coisa. Para derrotar os inimigos, o trio deve encontrar diversos objetos caseiros, para criar artefatos especiais, como o Esmagador, o Disparador, a Alavanca Forçadora, e, o Pulverizador. Para maiores detalhes, consultar o site da própria empresa: http://brasil.ea.com.

Cinema e DVD, simultâneos

Quem se garante, não tem medo da concorrência. Este deve ser o pensamento da National Lampoon Inc., grupo de entretenimento americano, que vai testar uma ousada estratégia de marketing, com seu mais recente filme, a comédia “Blackball”. O filme, que estréia nos cinemas americanos nesta sexta-feira, dia onze, será lançado, em DVD, apenas quatro dias depois, no dia 15 de fevereiro. Além de aproveitar toda a campanha publicitária do lançamento na telona, o grupo aposta no ótimo apelo de vendas do formato digital. Para se ter idéia, no ano passado, as vendas de DVDs, nos Estados Unidos, chegaram a 15 bilhões de dólares, enquanto as bilheterias dos cinemas arrecadaram “apenas” 9,4 bilhões. Se vai dar certo? Quem viver, verá.

Os filmes do Oscar, na internet

Para pirata, não há remédio! Apesar de toda a pressão da Academia, para evitar a pirataria, chegando a expulsar – pela primeira vez, em sua história – um membro, por ter permitido a cópia de um DVD sob sua guarda, nada menos do que 25, dos 30 filmes indicados ao Oscar, este ano, já estão disponíveis na internet. Essa informação, disponível no site http://waxy.org/, é o resultado de uma pesquisa realizada por Andy Baio, responsável pelo site. Além de não estarem incluídas, as categorias Filme Estrangeiro, e, Documentário, só contabiliza as cópias, em DVD, e, VHS, enviadas pelos estúdios aos jurados que votam em importantes premiações do cinema. Não são consideradas, também, as cópias piratas, filmadas de salas de cinema.

“Top Gun”, em Edição Especial

Se você é um dos que curtiram o romance de Tom Cruise e Kelly McGillis, ao som de “Take My Breath Away” (mesmo sem saber que o galã teve que subir num banquinho, para beijar a moça), saiba que alguém lá em cima gosta de você. O filme “Top Gun – Ases Indomáveis”, mereceu um relançamento, em DVD, numa edição para lá de especial. Além do filme, com áudio DD e DTS, e, formato de tela widescreen anamórfico, a edição traz dois discos, com um monte de extras: Making Of: “Zona de Perigo: O Making Of”, Comentários do Diretor: Comentários do Produtor Jerry Bruckheimer, Diretor Tony Scott, Roteirista Jack Epps, Jr., Capitão Mike Galpin, Consultor Técnico Pete Pettigrew e Vice-Almirante Mike McCabe, Videoclipes: Kenny Loggins “Danger Zone”, Berlim “Take My Breath Away”, Harol Faltermeyer e Steve Stevens “Top Gun Anthem”, Comerciais de TV, Entrevista com Tom Cruise, Bastidores, e, Fotografias da Produção. Atenção, pois há, também, uma edição simples, contendo apenas o filme.

Filme recomendado: “Em Busca da Terra do Nunca”

O garoto perdido que encontrou o seu destino

Certamente, em alguma época de sua vida, todo leitor, ao ler uma obra-prima, de algum gênio da literatura, parou para se perguntar: como é que alguém tem inspiração para escrever isso? Embora essa seja, realmente, a marca do gênio, algum fato, ou, situação, na vida real, serviu de base para o processo criativo do escritor. Este é o tema do filme “Em Busca da Terra do Nunca”, em cartaz, nos cinemas, sobre o escritor James Barrie, e, sua mais conhecida obra, “Peter Pan”.

O filme, do diretor Marc Foster (“A Última Ceia”), apresenta o escritor, vivido por Johnny Depp, como um típico inglês (embora ele fosse escocês), regrado, e, distante, mantendo uma relação formal com a jovem esposa. Apesar de uma carreira de sucessos, sua última peça fora um fracasso, no teatro, e, buscava inspiração para uma nova obra.

A ida diária ao parque, onde passeava com o cachorro, e, servia de escritório ao ar livre, proporcionou o encontro que mudaria a sua vida. O acaso o fez conhecer Sylvia Llewelyn Davies (Kate Winslet), que enviuvara recentemente, e, seus quatro filhos. Envolvendo-se nas brincadeiras com as crianças, Barrie passa a partilhar as suas fantasias, transvestindo-se de piratas, índios, caubóis, transformando jardins em castelos, e, parques em navios de corsários.

Aos poucos, Barrie passa a fazer parte ativa da vida dos Davies, tornando-se figura indispensável, para as crianças, e, ao mesmo tempo, provocando um forte antagonismo na rigorosa avó (a ótima Julie Christie), preocupada com os falatórios sobre a presença de um homem casado, tão próximo à sua filha.

Ao mesmo tempo em que cresce o seu envolvimento, com Sylvia, e, as crianças, Barrie começa a traduzir, em uma nova peça, todas as situações que percebia, em seu contato diário com os meninos. Para um público boquiaberto, é apresentada, em 1904, uma estranha peça de teatro, que misturava fadas, piratas, índios selvagens, e, um misterioso garoto que recusava-se a crescer: Peter Pan. O sucesso da nova peça é empanado por uma nova ameaça, que traz a sombra da tragédia para a família Davies.

Obviamente, ao se traduzir, para as telas do cinema, uma vida real, é necessário alguma liberdade poética, nome que os eruditos usam quando se quer enfeitar alguma coisa. No caso de “Em Busca da Terra do Nunca”, as liberdades usadas tornaram o filme uma obra muito bonita, e, romântica, criando um clímax magnífico.

Na vida real, nunca houve, como todas a evidências indicam, qualquer relação, entre Barrie e Sylvia, além de uma profunda amizade. Além do mais, na época em que conheceu o escritor, Sylvia ainda não era viúva, pois o seu marido, Arthur, só morreria em 1907, três anos depois da estréia de Pan no teatro. Sylvia morreu três anos depois do marido, em 1910. Barrie fez muito pelas crianças, mas, as desgraças ainda afetariam os Davies. Três, dos cinco irmãos, tiveram mortes trágicas: dois suicidaram-se, e, um morreu na Primeira Guerra Mundial. Peter, que emprestou seu nome para o título da obra centenária, atirou-se embaixo de um trem, aos 63 anos, amaldiçoando o dia em que Barrie escreveu Pan.

Quanto à obra “Peter Pan”, apesar de ter chegado aos palcos em 1904, só apareceu, como livro, em 1911, num texto ambíguo, e, fora do padrão de construção narrativa, tornando-se um fracasso de público. Foi adaptado para musical em 1950, com várias reedições, até chegar à televisão. No cinema, a primeira tentativa foi em 1924, ainda na época do cinema mudo. Um sucesso maior foi obtido com o desenho da Disney, em 1953. recentemente, em 2003, uma nova adaptação chegou às telas, dirigida por P.J.Hogan. Como queria beneficiar crianças, tanto quanto possível, Barrie doou os direitos de Peter Pan para Hospital Infantil de Great Ormond Street, em Londres, que, por sinal, está procurando escritor para criar a continuação das aventuras do menino que não queria crescer.

No Brasil, o nosso maior escritor infantil, Monteiro Lobato, reescreveu a história, através dos personagens do Sítio do Picapau Amarelo, interpretando-a aos olhos tupiniquins – com extrema maestria, vale salientar. Para saber mais, sobre outras histórias com o personagem Peter Pan, consulte o site www.classic-literature.co.uk/scottish-authors/james-barrie.

Embora criticado pela pieguice, ou, apelo ao sentimentalismo do espectador, não há como negar que “Em Busca da Terra do Nunca” é um filme bonito e sensível, direcionado para toda a família. Talvez, a sua maior virtude, seja manter, como fio condutor, assim como no livro “Peter Pan”, a dualidade da alegria de viver, e, o ser adulto, que, na verdade, traduz o medo da morte.

O elenco está excepcional, a começar pelo próprio Depp, anos-luz de sua estréia em “A Hora do Pesadelo”, nos idos de 1984. Passando por papéis tão diversos, como Edward Mãos-de-Tesoura, Don Juan de Marco, e, o capitão Sparrow, de “Piratas do Caribe”, Depp prova, mais uma vez, sua versatilidade. Para os próximos meses, é esperada a nova versão de “A Fantástica Fábrica de Chocolates”, também estrelada por ele. O resto do elenco também está fantástico, tanto Julie Christie, que mereceu indicação ao Oscar, como Kate Wislet, que vive uma belíssima Sylvia, traduzindo toda a dor e tristeza da jovem viúva. Dustin Hoffman, que sofreu um acidente nas filmagens, perdendo a ponta de um dedo, está perfeito, como o agente de teatro que dá suporte a Barrie.

“Em Busca da Terra do Nunca” recebeu sete indicações ao Oscar, nas categorias Melhor Filme, Melhor Ator (Johnny Depp), Melhor Direção de Arte, Melhor Figurino, Melhor Edição, Melhor Trilha Sonora e Melhor Roteiro Adaptado. Ao Globo de Ouro recebeu cinco indicações nas categorias Melhor Filme – Drama, Melhor Diretor, Melhor Ator – Drama (Johnny Depp), Melhor Roteiro e Melhor Trilha Sonora. Mas, as maiores indicações foram ao BAFTA, no qual recebeu onze indicações: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator (Johnny Depp), Melhor Atriz (Kate Winslet), Melhor Atriz Coadjuvante (Julie Christie), Melhor Trilha Sonora, Melhor Figurino, Melhor Fotografia, Melhor Maquiagem, Melhor Desenho de Produção e Melhor Roteiro Adaptado. O filme ganhou o Prêmio Lanterna Mágica, no Festival de Veneza.