Claquete 14 de janeiro de 2005
Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com
O que está em cartaz
Além dos turistas, Natal também está sendo invadida por macedônios e golfinhos… Neste final de semana, estréia o tão esperado “Alexandre”, de Oliver Stone, causa de muita polêmica e discussão. Em sua companhia, “Eliana em O Segredo dos Golfinhos”, com a apresentadora infantil Eliana. Nas continuações, filmes para todos os gostos: “A Lenda do Tesouro Perdido”, com Nicolas Cage, e, grande elenco, numa aventura no estilo Indiana Jones, “Blade – Trinity”, com Wesley Snipes retomando seu papel do meio-homem, meio-vampiro, combatendo o próprio Drácula, George Clooney e sua turma agitam com “Doze Homens e Outro Segredo”, Lázaro Ramos e Deborah Secco vivem suas agruras, em “Meu Tio Matou um Cara”, e, Richard Gere, Jennifer Lopez e Susan Sarandon rodopiam para valer, na comédia romântica “Dança Comigo”, os suspense “O Grito”, remake de um famoso filme japonês, e, “O Filho de Chucky”, o Brinquedo Assassino na segunda geração. Para a criançada, além da maravilhosa animação “Os Incríveis”, parceria da Disney com a Pixar, campeão de audiência nos cinemas americanos, tem também o desenho animado “Bob Esponja”, da Nickelodeon, e, as produções nacionais “Tainá 2 – A Aventura Continua”, e, “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida”. Em pré-estréia, “A Volta ao Mundo em 80 Dias”, com Jackie Chan.
Estréia 1: “Alexandre”
Alexandre, o Grande, conquista, novamente, o mundo. Desta vez, através das telas de cinema, graças a Oliver Stone, numa superprodução com quase três horas de duração. Conquistando 90% do mundo até então conhecido, aos 25 anos, Alexandre, O Grande (morto em 323 a.C.) – interpretado por Colin Farrell – liderou seu exército por 22 mil milhas, durante oito anos, dominando todas as terras que encontrava pela frente. Vindo da minúscula Macedônia, Alexandre conquistou o Império Persa, o Egito, e, finalmente, encontrou seu caminho à Índia. O filme mostra o trajeto do conquistador durante esses anos de conquistas, assim como o relacionamento que ele mantinha com seu amigo mais íntimo, Hephaestion (Jared Leto), com seus pais, Felipe (Val Kilmer) e Olympia (Angelina Jolie), sua esposa ambiciosa Roxane (Rosario Dawson), e, o general Ptolomeu (Anthony Hopkins), seu homem de confiança. Considerada uma guerra impossível, Alexandre sai vitorioso, e, aumenta seus domínios para locais até então desconhecidos, como a Ásia Central e o Himalaia. Seus feitos militares fazem com que ele domine todo o território entre a Macedônia e a Índia, sem ter sofrido uma derrota sequer. Uma produção tão grande, sofre críticas igualmente grandes, que vão da atuação dos atores, até uma suposta, e, inoportuna, bisexualidade do conquistador. Este filme provocou uma enxurrada de documentários e livros sobre a vida do imperador macedônio. “Alexandre” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 6 do Moviecom. Para maiores de 14 anos.
Estréia 2: “Eliana em O Segredo dos Golfinhos”
Eliana, a apresentadora, interpreta uma apresentadora, nesta produção, dirigida por uma xará, Eliana Fonseca (“O Martelo de Vulcano”). A apresentadora Eliana está no litoral do Caribe, no México, para gravar um programa sobre golfinhos. Lá, ela conhece um biólogo (Daniel Del Sarto), que cuida dos golfinhos, e, também, um garoto apaixonado por animais, que, vê o mar pela primeira vez. Juntos, eles precisarão enfrentar um eco-predador, que é responsável por acidentes ecológicos em vários pontos do planeta, tendo apenas a ajuda de um golfinho muito especial. Nas filmagens, foi utilizado um golfinho animatrônico, durante as filmagens. O robô possuía pele de silicone, flutuava, piscava os olhos, e, realizava movimentos de barbatana, boca e cauda. A decisão pelo uso do golfinho animatrônico ocorreu devido à proibição de filmar com filhotes de golfinho no México. “Eliana em O Segredo dos Golfinhos” estréia nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. Censura livre.
Pré-Estréia: “A Volta ao Mundo em 80 Dias”
Em 1956, um trio inusitado estrelou um dos melhores filmes de todos os tempos. “A Volta ao Mundo em 80 Dias”, inspirada no famoso romance de Julio Verne, era levada às telas, tendo o fleugmático David Niven, o comediante Cantinflas, e, a novata Shirley MacLaine. O filme, que foi o primeiro exibido a cores em nossa televisão, conquistou cinco Oscars. Para repetir a façanha, Jackie Chan revive Passepartout, com direito às suas lutas acrobáticas. Na Inglaterra vitoriana, um excêntrico inventor, Phileas Fogg (Steve Coogan) diz a Lorde Kelvin (Jim Broadbent), o diretor da Academia Real de Ciências, que é capaz de dar a volta ao mundo em 80 dias, com a ajuda de seus companheiros Passepartout e Monique La Roche (Cécile de France). Lorde Kelvin aceita o desafio, e, com isso, o trio parte em uma aventura, que irá passar pelos cinco continentes. O filme, dirigido por Frank Coraci, conta com participações de Arnold Schwarzenegger, Owen Wilson, Kathy Bates, John Cleese, Luke Wilson, Mark Addy e Rob Schneider. Foi o último filme em que Schwarzenegger atuou, antes de ser eleito governador da Califórnia. Somente no sábado e domingo, no Cine 4 do Moviecom. Para maiores de dez anos.
O que está nas locadoras
Já passou na sua locadora esta semana? Além de filmes que ainda mantém grande procura, como “O Enviado”, e, “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”, já chegaram “Colateral”, com Tom Cruise e Jamie Foxx, “Hellboy”, o ótimo “O Terminal”, de Spielberg, estrelado por Tom Hanks, “Rios Vermelhos 2 – Anjos do Apocalipse”, com o excelente Jean Reno, “Mulher-Gato”, com a gatíssima Halle Berry, “No Pique de Nova York”, com as gêmeas Ashley e Mary-Kate Olsen, e, a última ousadia de Jim Carrey, “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. Confira!
DVD, o rei de 2004
Após três anos em queda, as vendas dos aparelhos eletroeletrônicos viraram a mesa, em 2004. Foram 35,78 milhões de aparelhos de áudio, vídeo, eletrodomésticos, e, portáteis, superando, em 20%, os números de 2003. Os leitores de DVD estão entre os campeões de vendas, tendo sido entregues ao varejo, em 2004, três milhões de unidades, 80% mais que em 2003. Além da concorrência, a oferta em escala barateou o produto, o que explica a popularização, junto com uma maior quantidade de títulos disponíveis. Para se ter uma idéia, cinco anos atrás, um aparelho de DVD custava o equivalente a mil dólares, enquanto hoje pode ser encontrado, facilmente, por menos de quatrocentos reais.
Novo formato do DVD pode se decidido pelo cinema pornô
Enquanto estúdios e fabricantes debatem qual será o sucessor do DVD, uma silenciosa categoria detém um peso importante nesta decisão. É que, os amantes de filmes pornô, sempre estiveram entre os “early adopters”, que é como são chamados os consumidores vorazes de tecnologia, que sempre compram os primeiros aparelhos de uma nova geração eletrônica. Isso aconteceu com os videocassetes, aparelhos de DVD, canais privê, e, conexões de alta velocidade à internet. Para se ter uma idéia, são lançados cerca de onze mil novos títulos de DVD adultos, a cada ano, e, seu apoio a um grupo pode definir o próximo padrão do vídeo doméstico.
Os incríveis criadores de “Os Incríveis”
O sucesso estrondoso de “Os Incríveis”, talvez se deva menos a uma poderosa campanha de marketing, do que a um bom produto, colocado no mercado por uma empresa – a Pixar – formada por artistas, e não, homens de negócios. Para conferir outros sucessos do estúdio, temos “Toy Story”, “Toy Story 2”, “Vida de Inseto”, “Monstros S.A.”, “Procurando Nemo”, e, o ainda inédito “Cars”, último exemplar da parceria com a Disney, previsto para novembro de 2005. Alguns curtas-metragens podem ser vistos, junto com os títulos citados. Dois que renderam Oscars para a Pixar foram “Geri’s Game”, onde um velho joga xadrez consigo mesmo, e, “For The Birds”, hilariante disputa, entre um bando de pássaros mal-humorados sobre um lugar ao sol.
O que vem por aí: cegos e heróis
Os cegos estão em alta, nos filmes orientais que estrearão a seguir. Além do samurai cego “Zatoichi”, dirigido por Takeshi Kitano, que também atua como o personagem-título, tem também uma dançarina cega, perita em artes marciais, no filme “A Casa das Adagas Voadoras”, de Zangh Yimou. Mas, cegueira à parte, o que os fãs aguardam, impacientes, é a estréia de “Herói”, do mesmo Yimou, com um retorno de Jet Li às origens. Li interpreta um guerreiro Wuxia, um cavaleiro errante, que derrota três perigosos bandidos, ganhando a honra de ser recebido pelo imperador. O personagem é visivelmente baseado em “Rashomon”, de Kurosawa. “Herói” foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro do ano passado, e, deve estrear, no Brasil, no próximo mês.
Filmes recomendados: “Círculo do Medo”/”Cabo do Medo”
Medo de cabo a rabo
Na indústria do cinema, as refilmagens são comuns. O filme, ou, os filmes sobre os quais conversaremos, vão mais além. Temos, não só, a mesma história, como o mesmo estúdio, e, até a repetição de alguns atores. Considerando que existe um intervalo de trinta anos entre uma versão e outra, poderíamos imaginar que é só uma cópia melhorada. Na verdade, é um dos casos mais bem sucedidos de refilmagem do cinema. Estou falando dos filmes “Círculo do Medo” e “Cabo do Medo”, que tinham o mesmo título original: “Cape Fear”, uma história que é do tempo em que Kojak ainda tinha cabelos.
Ambos os filmes foram baseados num romance policial, de nome “The executioners”, sobre a história de um advogado e sua família, que são ameaçados por um ex-presidiário. Até aí, nada de mais, pois já estamos de saco cheio de ver histórias semelhantes no “Linha direta”, da TV Globo. O que torna a história diferente é a forma, envolvente e asfixiante, que o bandidão Max Cady cerca a família de seu desafeto, o advogado Sam Bowden, como se fosse uma aranha, enrolando uma mosca presa em sua teia.
Quando assisti “Cabo do Medo”, no início dos anos noventa, fiquei impressionado com o filme. Desde a madrasta da Branca de Neve, nunca vira um vilão tão malévolo, e, determinado, quanto Max Cady. Só recentemente, quando descobri a existência de “Círculo do Medo” foi que descobri que a história realmente foi construída em torno do vilão, totalmente fora dos padrões hollywoodianos.
No filme de 62, os personagens refletiam bem a sua época. O advogado Bowden era um perfeito pai de família, e, cidadão exemplar. O testemunho dele foi determinante para mandar Max Cady para a cadeia, para uma sentença de oito anos, por ter violentado uma mulher. Gregory Peck, que também produziu o filme, interpretou o advogado, enquanto Robert Mitchum encarnou o ex-presidiário, sem dúvida, o melhor papel em toda a sua carreira.
O filme é fortemente centrado nos dois personagens principais, embora o brilho absoluto seja de Mitchum, com um Cady frio, cínico, e, cruel, mas, estranhamente elegante. A mulher e a filha do advogado são elementos complementares, sem grande influência na trama. Com sua fotografia preto-e-branco maravilhosa, o filme consegue manter a atmosfera noir, e, passar, para o espectador, a sensação opressiva e aterradora, de um bom suspense psicológico. O embate final, onde o Bem, e, a Justiça prevalecem, não chega a enquadrar o filme como ação.
Considerando-se que, nessa época, já eram comuns superproduções como “Cleópatra”, “Spartacus”, etc., foi preciso certa ousadia para produzir um filme “B”. E, que se tornou um clássico, no gênero. Por falar em ousadia, o filme sofreu muitas críticas na época, chegando a sofrer 161 cortes na censura britânica.
Três décadas depois, a recontagem de “Cape Fear” surgiu, através de Martin Scorcese, que terminara o excelente “A Última Tentação de Cristo”. Numa produção muito mais rica, e, com efeitos especiais impensáveis, na época do primeiro filme, “Cabo do Medo” trouxe, agora, um elenco igualmente estelar. No papel do advogado, e, sua família, Nick Nolte, Jessica Lange, e, Juliette Lewis. Para o malévolo Cady, ninguém menos que Robert de Niro. Numa homenagem à equipe do primeiro filme, Robert Mitchum, Martin Balsam, e, Gregory Peck aparecem, em algumas pontas maravilhosas.
Apesar de suas limitações, Nick Nolte assume bem o papel do advogado perseguido. Contudo, é o camaleônico Robert de Niro que dá o tom ao filme. Diferente da caracterização de Mitchum, Niro traz um Cady brutal, grosseiro, desagradável, que também consegue ser sensual, e, persuasivo, quando lhe convém. As personagens da mulher, e, da filha, agora são muito mais atuantes. Julitte Lewis recria a filha adolescente, agora com um formato sensual, e, perigosamente receptiva, ao Lobo Mau vivido por Niro.
A nova versão de “Cape Fear” ficou muito mais interessante, por fugir da dicotomia “bonzinho x malvado”, da primeira edição. A família Bowden não é tão perfeita agora. Sam é um homem que já teve várias relações extra-conjugais, e, no momento retratado, está numa paquera com uma colega de trabalho. A mãe (a ótima Jessica Lange), é uma mulher alienada, totalmente envolvida com seu trabalho. A filha (Juliette Lewis, que sempre faz bem esses papéis de maluquete), já teve problemas por uso de maconha, e, tem uma sexualidade precoce.
Mas, a mudança mais interessante ficou ligada à motivação da vingança de Cady. No primeiro filme, era o testemunho, de um cidadão contra um bandido, que despertava a sede de vingança. Na segunda versão, Bowden fora o advogado de Cady ao trabalhar como defensor público. Ao defendê-lo de uma acusação de estupro, Bowden fica horrorizado ao ver como Cady maltratara a vítima. Durante o processo, Bowden recebeu uma informação que poderia reduzir a pena, ou, até mesmo, libertar Cady. Sabendo que o acusado era analfabeto, Bowden oculta a informação. Para nós, brasileiros, esse aspecto talvez não desperte a mesma indignação que os americanos sentiriam. Mas, para uma sociedade onde a Lei vale mais que a Justiça, o advogado cometeu um crime tão terrível quanto o estupro de Cady.
O filme prossegue, num jogo de gato e rato, com todos os clichês do gênero, culminando no confronto, no Cabo do Medo (que é um lugar da Carolina do Norte), em meio a uma tempestade, criada pela equipe de efeitos especiais. A luta final coloca em cheque o limite de civilização e bestialidade, da natureza humana, nos dois homens, restando dúvidas sobre qual prevaleceu. O final do segundo filme é radicalmente diferente do primeiro.
Os dois filmes tem edições em DVD, bem cuidadas, que só pecaram nos extras. “Círculo do Medo” traz o filme em seu formato widescreen original (1.85:1), e, legendas em português, espanhol, inglês, chinês, japonês, coreano e tailandês. Como extras, trailer, galeria de fotos, notas de produção, e, um making of com trinta minutos de duração, infelizmente, sem legendas. Uma curiosidade, revelada nos extras: ao receber uma homenagem das autoridades de Savanah, onde o filme foi rodado, Robert Mitchum revelou que, em sua juventude, fora preso, e, condenado, ali.
A edição de “Cabo do Medo” traz dois discos. No primeiro, o filme completo e interação do roteiro com a cena. O filme vem com formato widescreeen, e, trilha sonora em inglês e japonês(?). Detalhe: existe uma trilha Dolby Digital e outra DTS, ambas de qualidade fantástica. No disco de extras, além de notas de produção, trailer, cenas deletadas, e, galeria de fotos, existe um documentário, de oitenta minutos, esmiuçando todos os detalhes do filme. Mais uma vez, o problema da linguagem: só existem legendas em inglês e japonês (!). Existe também um pequeno documentário sobre as cenas do barco.
“Cabo do Medo” traz à tona um problema comum em nossa sociedade. Não existe forma do Estado proteger alguém, preventivamente, de ser vítima de um crime. A nossa legislação, e, a estrutura que a suporta, só estão preparadas para punir um crime, e, não, para evitá-lo. Para piorar, ainda temos a repressão à autodefesa, com campanhas esdrúxulas, para o desarmamento do cidadão comum. E, para completar, grupos de defesa de direitos humanos, que só se preocupam com os pobres criminosos, nunca com suas vítimas.
Problemas sociais à parte, a dobradinha de “Círculo do Medo” e “Cabo do Medo” certamente é um programa excelente, para qualquer cinéfilo. Seja pelos aspectos técnicos, seja pela atmosfera envolvente, ou, simplesmente, para curtir dois ótimos filmes de suspense, dificilmente alguém terá motivos para reclamar. Não esqueçam da pipoca!