Claquete 26 de novembro de 2004
Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com
O que está em cartaz
Enquanto Natal (e meio mundo de gente!) se prepara para o Carnatal, algumas estréias interessantes chegam aos nossos cinemas. As mais badaladas são o suspense “Sob o Domínio do Mal”, refilmagem de um sucesso de Frank Sinatra, que chega, agora, estrelado por Denzel Washington e Meryl Streep, “Má Educação”, filme do grande diretor espanhol Pedro Almodóvar, tocando no delicado tema do abuso sexual de crianças, e, “O Expresso Polar”, interessante fantasia em animação gráfica, onde o veterano Tom Hanks serviu de modelo para nada menos do que seis personagens! Ainda nas estréias, “Wimbledon – O Jogo do Amor”, comédia romântica com Kirsten Dunst. Apenas no final de semana, acontecem as pré-estréias de “Bridget Jones no Limite da Razão”, com Renée Zellweger repetindo o papel da gordinha tresloucada, e, “A Sétima Vítima”, produção espanhola estrelada por Anna Paquin (“O Piano”). Nas continuações, o suspense “Os Esquecidos”, com a talentosa Julianne Moore, o drama “Contra Todos”, a comédia romântica “Como Fazer um Filme de Amor”, o remake romântico “Dirty Dancing – Noites em Havana”, com direito a muita dança em plena revolução cubana, “Celular – Um Grito de Socorro”, suspense com a ótima Kim Basinger, “Com a Bola Toda”, comédia besteirol sobre competição de queimada, “Exorcista: O Início”, terror com o que seria a origem da famosa história do filme original, e, “Táxi”, comédia policial, com Queen Latifah, e, a topmodel Gisele Bundchen. Na 3ª Mostra Brasil, será exibido o documentário “Edifício Master”, com preço especial. No Filme de Arte, do Cine Natal 2, uma produção Argentina, “Valentin”.
Estréia 1: “Sob o Domínio do Mal”
Ben Marco (Denzel Washington) é um soldado que, em meio a Guerra do Golfo, é seqüestrado pelo inimigo, juntamente com sua tropa. Alguns anos depois, já em sua casa, Ben começa a se lembrar do processo de lavagem cerebral, pelo qual passou, enquanto esteve preso, que fazia com que cumprisse ordens, sem contestá-las. Ao descobrir que um de seus companheiros de tropa, Raymond Shaw (Liev Schreiber), está concorrendo a um alto cargo na vida política do país, Ben tenta entrar em contato com ele, temendo que ele esteja sendo controlado, neste exato momento. Dirigido por Demme (“O Silêncio dos Inocentes”), o filme traz ainda, no elenco, Meryl Streep e Jon Voight. Refilmagem de um filme homônimo, de 1962, estrelado por Frank Sinatra. “Sob o Domínio do Mal” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 1. Para maiores de 14 anos.
Estréia 2: “O Expresso Polar”
Baseado no livro de Chris Van Allsburg (o mesmo autor de “Jumanji”), “O Expresso Polar” conta a história de um garoto que acredita em Papai Noel. Apesar de seus amigos insistirem que o bom velhinho não passa de lenda, na noite de Natal o menino embarca, com colegas, em um trem, rumo ao Pólo Norte, a fim de provar sua crença. O trem sai direto da porta de sua casa para o lar do Papai Noel. Prodigioso trabalho de animação, “O Expresso Polar” usa a técnica “motion-capture”, capturando os movimentos de um ator real, e, transportando-os para o mundo digital. No filme, Tom Hanks interpreta vários personagens, entre eles, o menino, o condutor do trem, um robô, e, o Papai Noel. Usando uma roupa especial com sensores que captavam seus movimentos, Tom Hanks teve seus movimentos e suas expressões registrados por computador, criando os diferentes personagens. “O Expresso Polar” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 6 do Moviecom, ambas as cópias dubladas. Censura livre.
Estréia 3: “Wimbledon – O Jogo do Amor”
Peter Colt (Paul Bettany) é um tenista em fim de carreira, que ocupa uma posição bastante baixa no ranking mundial. Sem possuir pontuação suficiente para participar do torneio de Wimbledon, ele recebe um convite dos organizadores, para que possa disputar aquela que poderá ser a última competição de sua carreira. Porém, ao apaixonar-se por Lizzie Bradbury (Kirsten Dunst), a mais nova estrela do tênis feminino, Colt ganha novo fôlego, para disputar o título da competição. A organização do torneio de Wimbledon concedeu, à produção do filme, um acesso sem precedentes ao All England Lawn Tennis Club, onde são realizados os jogos, para que nele pudessem ser rodadas algumas cenas, durante o torneio de 2003. Dirigido por Richard Loncraine, “Wimbledon – O Jogo do Amor” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 5 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.
Estréia 4: “Má Educação”
Quando criança, Ignacio (Gael Garcia Bernal) estudou em um colégio interno católico. Lá, ele sofreu abusos sexuais, por parte de seu professor de Literatura, o padre Manolo (Daniel Gimenez Cacho), que marcaram sua vida para sempre. Ignacio apaixona-se por um colega do colégio, Enrique (Fele Martínez), que termina sendo expulso. Vinte anos mais tarde, Ignacio é, agora, um travesti chamado Zahara. Ele reencontra Enrique, com quem relembra várias histórias do passado comum. Dirigido por Pedro Almodóvar, foi o primeiro filme espanhol a ser escolhido para abrir o Festival de Cannes. “Má Educação” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom. Para maiores de 18 anos.
Pré-Estréia 1: “Bridget Jones no Limite da Razão”
A desparafusada Bridget Jones volta à cena, mais uma vez, metendo-se em gafes, enquanto tenta administrar suas incertezas. Bridget Jones (Renée Zellweger) está namorando firme Mark Darcy (Colin Firth) há seis semanas. O que deveria ser um paraíso, transforma-se em dúvidas e incertezas, quando ela passa a questionar o que deve fazer, para manter o homem de seus sonhos ao seu lado. A situação fica ainda pior após a contratação da nova colega de trabalho de Mark, de quem Bridget morre de ciúmes, e, o reaparecimento de Daniel Cleaver (Hugh Grant), seu ex-chefe mulherengo, que volta a assediá-la. “Bridget Jones no Limite da Razão” terá uma pré-estréia, sexta-feira e sábado, no Cine 1 do Moviecom, na sessão de 21h. No sábado, sessão extra, às 23h. Para maiores de 12 anos.
Pré-Estréia 2: “A Sétima Vítima”
Quarenta anos atrás, um ser que vive nas trevas foi invocado, em uma casa, que foi abandonada em seguida. Este ser permaneceu vivendo de forma oculta, fazendo planos, e, aguardando que novos moradores se mudassem para lá. Décadas se passaram, até que uma nova família se muda para o local. Produção espanhola, dirigida por Jaume Balagueró, traz a talentosa Anna Paquin, no papel principal. “A Sétima Vítima” terá uma pré-estréia, de sexta-feira a domingo, no Cine 5 do Moviecom, na sessão de 21h40. No sábado, sessão extra, às 23h45. Para maiores de 14 anos.
Filme de Arte: “Valentin”
O Filme de Arte desta semana traz a produção argentina “Valentin”. 1960, Buenos Aires. Valentin (Rodrigo Noya) é um menino de nove anos, que vive com sua avó (Carmen Maura), já que seu pai vive sempre ocupado, trabalhando, e, sua mãe, está desaparecida, desde a separação de seu pai. Solitário, Valentin ocupa seu tempo sonhando tornar-se um astronauta, e, ouvindo as histórias contadas por sua avó. O grande sonho de Valentin é que seu pai o leve para conhecer sua mãe, mas, ele se irrita, à simples menção do nome dela. Valentin passa a acreditar que possa, enfim, ter uma mãe, quando conhece Leticia (Julieta Cardinali), a mais nova namorada de seu pai. Dirigido por Alejandro Agresti, “Valentin” ganhou o Prêmio Especial do Júri, e, a Menção Especial – Júri da ACCA, no Festival de Mar Del Plata. A sessão Filme de Arte será no Cine Natal 1, no dia 30, terça-feira, às 21h.
Mostra Brasil: “Edifício Master”
Na programação da 3ª Mostra Brasil, será exibido, de hoje até domingo, o filme “Edifício Master”, com entrada ao preço único de R$3,00. Durante sete dias, uma equipe de cinema filmou o cotidiano dos moradores do Edifício Master, situado em Copacabana, a um quarteirão da praia. O prédio tem 12 andares e 23 apartamentos por andar. Ao todo, são 276 apartamentos conjugados, onde moram cerca de 500 pessoas. O diretor Eduardo Coutinho, e, sua equipe, entrevistou 37 moradores, e, conseguiram extrair histórias íntimas e reveladoras de suas vidas. “Edifício Master” recebeu três indicações ao Grande Prêmio Cinema Brasil, nas categorias Melhor Documentário, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original. Ganhou o prêmio de Melhor Documentário, no Festival de Gramado. “Edifício Máster” será exibido, de sexta a domingo, na sessão de 17h, no Cine 3 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.
Filme estréia, ao mesmo tempo, no cinema, DVD e na TV
Por essa, ninguém esperava. O filme “Noel”, com Penélope Cruz, Susan Sarandon, Robin Williams, e, Paul Walker, estreou, na última sexta-feira, em várias cidades dos EUA. Além de estrear nos cinemas, o filme já começou a ser vendido em DVD, em vez de esperar meses, como costuma ocorrer, e, além disso, será exibido em 28 de novembro, pela rede de televisão TNN. Mas, antes que se pense que os produtores endoidaram, o filme será lançado em um tipo de DVD que se autodestrói quarenta e oito horas depois de aberto. Será Missão Impossível?
Advogados gregos ameaçam ação contra Oliver Stone por “Alexandre”
Um grupo de advogados gregos está ameaçando processar o estúdio Warner Brothers e o diretor Oliver Stone, por sugerir que Alexandre, o Grande, tenha sido bissexual, no filme “Alexandre”, que entra em cartaz esta semana, nos Estados Unidos. O protesto não se deve a conceitos homófobos, mas a apresentar, como verdade, fatos puramente ficcionais. É o mesmo caso do romance “Código da Vinci”, que propaga, como verdadeiras, meras especulações de caçadores de teorias conspiratórias absurdas, e, sem qualquer fundamentação científica.
Filme recomendado: “Rambo – Programado Para Matar”
Rambo, o Quixote que venceu
Uma coisa que sempre se reclama, em se tratando de cinema, é que, as adaptações de livros são incompletas, ou, malfeitas. Pela primeira vez, descobri um caso em que isso aconteceu… para melhor! O filme é conhecidíssimo, a ponto de seu personagem principal ter virado adjetivo de valentão. Estou falando de “Rambo – Programado Para Matar”, lançado em 1982.
Como se explica o sucesso estrondoso de “Rambo”? Está certo que Sylvester Stallone já era um ícone mundial, devido a Rocky, mas, cá pra nós, o talento cênico do rapaz não seria suficiente para atrair multidões. Qual foi o ingrediente mágico, então?
Ao que parece, “Rambo” materializou a fantasia que está no inconsciente coletivo do americano, do indivíduo que enfrenta o sistema. O sistema sempre vence, é claro, mas o herói dá muito trabalho antes de desistir. Dez anos antes, “Billy Jack” seguira a mesma fórmula, com igual simpatia do público.
“Rambo” trouxe um novo ingrediente, que foi a difícil adaptação dos veteranos da guerra do Vietnã. Essa guerra, resultado da inconseqüência dos Kennedy, trouxe morte e desajustes para milhares de americanos, que foram forçados a lutar por algo que não tinha absolutamente nada a ver com eles. E, ao voltar para casa, ao invés de ser recebidos como sobreviventes do inferno, receberam a culpa que era devida aos políticos.
O que diferencia “Rambo” de outros filmes sobre a guerra do Vietnã? Enquanto “Franco-Atirador” e “Apocalipse Now” narram fatos ocorridos no palco da guerra, “Rambo” mostra o lado negro da volta para casa. Preconceitos, dificuldades de adaptação, traumas de guerra. Junte-se a isso o exercício do poder com arrogância e tem-se aí a história de “Rambo”.
E, onde foi que o filme divergiu do livro? Ambos mostram a história de um veterano da guerra do Vietnã, que vaga pelo seu país. Ao passar por uma pequena cidade, é considerado um vagabundo pelo xerife local, e, termina preso, só por insistir em comer. Na prisão, os guardas o atormentam, sem saber que estão reavivando situações que remetem ao que passou, nas mãos dos vietcongues. Ao ultrapassar esse limite de consciência, Rambo foge da cadeia, sendo perseguido pela polícia, até uma floresta próxima. Derrotando a força local, Rambo continua a ser perseguido, pois, devido à queda de um helicóptero, um dos policiais morre.
Nessa altura do campeonato, a polícia local, a estadual, e, até a Guarda Nacional são envolvidas, cercando o local onde Rambo se esconde. Um militar misterioso, o coronel Trautman, tenta convencer os policiais a desistir daquele aparato, pois o homem que estão caçando é simplesmente um herói de guerra, um ex-militar com muitos conhecimentos de guerrilha, detentor das mais altas honrarias concedidas a um soldado.
Isso nada vale para o xerife, ele próprio um herói da guerra da Coréia, que não admite interferências em seu trabalho. O filme, então, cresce para o embate final, que acontece dentro da própria cidade que hostilizou Rambo.
O livro conta uma história única. O personagem principal é um herói trágico, que independente de sua culpa, termina sendo o flagelo de Deus, para aquela cidade, que ousou enfrentá-lo. A contagem de mortos, no livro de David Morrel, chega a 250, enquanto que, no filme, a única morte ocorre por acidente, do policial que cai do helicóptero. No final do livro, Rambo, e, o xerife, morrem no confronto final, encerrando a tragédia.
Qual a razão da história ter sido suavizada no cinema? O roteiro foi co-assinado por Stallone, que também vetou as cenas mais sombrias do filme. Seja lá qual tenha sido a sua motivação, o Rambo do cinema ficou muito mais humano, mais próximo do espectador, e, por incrível que pareça, mais verossímil do que a máquina destruidora que aparece nas duas continuações. Explico: é mais fácil você indentificar-se com uma pessoa injustiçada pelo sistema, do que com alguém que consegue matar todo um pelotão de comandos russos.
Seja como for, “Rambo” teve uma química perfeita, do roteiro levado às telas, um elenco experiente, e, locações maravilhosas. Brian Dennehy, como o xerife durão, apresenta uma de suas melhores performances no cinema, enquanto que Stallone, mesmo com todas as suas limitações, faz um John Rambo melhor do que em “Rambo II – A Missão” e “Rambo III – O resgate”. No elenco de apoio, Richard Crenna conduz com elegância o seu coronel Trautman, enquanto que, um novato de cabelo vermelho prenunciava o sucesso que faria em “Nova York Contra o Crime” – David Caruso.
O DVD poderia ser melhor, já que a versão americana trazia comentários do autor do livro, Making Of e notas de produção e elenco, enquanto que a versão tupiniquim veio sem nada. Contudo, só ter mantido o formato de tela original de cinema já foi lucro. O som é mono, como a edição americana.
Para os que colecionam curiosidades, existiu realmente um John Rambo, que morreu no Vietnã, em 1969, com vinte e quatro anos. Fiz essa descoberta, por acaso, ao folhear a lista do Memorial dos Mortos no Vietnã, em Washington.
“Rambo” pode não ser o melhor filme de protesto contra a Guerra do Vietnã e suas conseqüências. Também não é o mais agressivo filme de ação estrelado por uma montanha de músculos. Contudo, o filme foi um marco no cinema de ação, gerando seqüências, cópias, paródias, etc.. Talvez, a sua maior qualidade esteja no equilíbrio do personagem romântico e quixotesco, com o ideal heróico moderno, que habita em nosso inconsciente. Recomendo, tanto aos saudosistas, quanto aos mais jovens.