Claquete 06 de agosto de 2004

Newton Ramalho – colunaclaquete@gmail.com

O que está em cartaz

Fim de férias, aos poucos, a programação começa a contemplar os adultos. Neste final de semana, estréiam “Eu, Robô”, ficção-científica estrelada pelo rapper Will Smith, e, o romance “Diário de Uma Paixão”, com os ótimos James Garner e Gena Rowlands. Lamentavelmente, ainda teremos que esperar “Fahrenheit11 de Setembro”, já que não chegou a Natal, o que pode ser considerado o melhor documentário dos últimos anos. Continuam em cartaz: “Hellboy”, mais uma adaptação de um herói de quadrinhos, com muita ação e efeitos especiais, a comédia romântica “Meninas Malvadas”, o ótimo “Efeito Borboleta”, filme estilo viagem no tempo, “Cazuza – O Tempo Não Pára”, cinebiografia autorizada do inesquecível Cazuza, e, para a criançada, “Garfield”, com o gato mais folgado do mundo, “Homem Aranha 2”, dublado e legendado, a produção da Disney, “Nem Que a Vaca Tussa”, e, o nacional “Didi Quer Ser Criança”, com Renato Aragão. Neste final de semana, acontece a pré-estréia de “Um Príncipe em Minha Vida”. Já no Fime de Arte, “De Corpo e Alma”, estrelado por Neve Campbell.

Eu, Robô

Will Smith, estrelando um filme de ficção-científica? Antes que o leitor se assuste, pensando que é mais uma continuação de “Independence Day” ou “MIB”, pode ficar tranqüilo. Desta vez, o filme “Eu, Robô”, baseia-se nos elementos de um dos mais famosos livros de Asimov, de mesmo nome. O livro, uma coletânea dos primeiros contos sobre robôs, é onde foram apresentadas, pela primeira vez, as famosas leis da robótica, que, assim como a personagem Susan Calvin (Bridget Monayhan), estão presentes no filme. Em 2035, a existência de robôs é algo corriqueiro, sendo utilizados, constantemente, como empregados, e, assistentes dos humanos. Os robôs possuem um código de programação chamado Leis da Robótica, que impedem que façam mal a um ser humano. Estas leis parecem ter sido quebradas, quando o Dr. Miles aparece morto, e, o principal suspeito de ter cometido o crime é, justamente, o robô Sonny. Caso Sonny realmente seja o culpado, a possibilidade dos robôs terem encontrado um meio de quebrar a Lei da Robótica pode permitir que eles dominem o planeta, já que nada mais poderia impedi-los de subjugar os seres humanos. Para investigar o caso, é chamado o detetive Del Spooner (Will Smith), que, com a ajuda da Dra. Susan Calvin, precisa desvendar o que realmente aconteceu. “Eu, Robô” estréia nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 6 do Moviecom. Censura 12 anos.

Diário de Uma Paixão

Noah Calhoun (James Garner) é um senhor de idade que visita, periodicamente, Allie Nelson (Gena Rowlands), em um asilo. Noel lê para Allie um antigo diário, que narra a história de um jovem casal, separado pela guerra, e, que apenas se reencontra 14 anos depois. Quando uma adolescente (Rachel McAdams) vai passar o verão com a família, na cidade litorânea de Seabrook, na Carolina do Norte, nos anos 40, conhece um garoto (Ryan Gosling), que mora na cidade. É amor à primeira vista. Embora a menina seja de uma família rica, e, ele seja um operário, os dois apaixonam-se profundamente, durante um verão repleto de emoção e liberdade. Eles são separados pelas circunstâncias e pela súbita eclosão da Segunda Guerrra Mundial, mas, ambos permanecem assombrados pelas lembranças um do outro. Com a memória prejudicada pela idade, Allie ouve as histórias, e, acaba se recordando de um grande amor que viveu. O filme é de Nick Cassavetes, que dirigiu o ótimo “Um Ato de Coragem”. No elenco, brilham as experientes estrelas de Garner e Rowlands, que, por sinal, é mãe do diretor. Estréia nesta sexta-feira, no Cine 1 do Moviecom. Censura 14 anos.

Filme de Arte: De Corpo e Alma

Após um longo e tenebroso inverno, a sessão Filme de Arte, como Fênix, ressurge das cinzas, trazendo o interessante filme “De Corpo e Alma”. Não confundir com a novela homônima, exibida na TV Globo. Ry (Neve Campbell) é uma bailarina de grande talento, que se dedica como poucas ao balé. Porém, ela entra em conflito com sua própria carreira, após tornar-se a principal estrela de uma conceituada companhia. Neve ficou conhecida mundialmente por sua participação nos filmes “Pânico”, onde passava o tempo todo gritando e fugindo do assassino. “De Corpo e Alma” é menos um filme, e, muito mais, um palco de danças, onde são mostradas, não só as magníficas exibições dos bailarinos, mas, também, os dramas que acontecem por trás das cortinas. Sessão única, às 21h10 da próxima terça-feira, no Cine Natal 1. Censura 12 anos.

Adeus a um gênio: morre Cartier-Bresson

Esta coluna não poderia deixar de homenagear Henri Cartier-Bresson, genial fotógrafo francês, que morreu esta semana, aos 95 anos. Filho de um industrial, Bresson explorou o mundo das imagens, passando pelo cinema, nas décadas de 30 e 40, mas, dedicando-se principalmente à fotografia, inspirando gerações inteiras de fotógrafos do mundo inteiro. Fundou, ao lado de outro gênio do fotojornalismo, Robert Capa, a agência Magnun, buscando sempre retratar imagens verdadeiras, humanas, em sintonia com o retratado. Usando uma única câmera, e, sempre em preto e branco, Bresson produziu imagens antológicas, que primavam por uma composição rigorosa, embora nunca concordasse com fotos posadas ou produzidas em estúdio. Ao gênio, que conseguia passar a idéia de movimento, em uma imagem parada, um sincero minuto de silêncio.

HT IN A BOX

Certamente, se o leitor se interessa por VHS e DVD, já deve ter visto esta sigla em algum lugar. Mais do que uma sigla, HT-IN-A-BOX, é um conceito. Hometheater in a box, é uma expressão inglesa, que engloba sistemas de hometheater, de custo mais acessível, e, que, já vem com todos os componentes, em uma única caixa. Normalmente, o conjunto é formado por um receiver compatível com o padrão Dolby Digital, cinco caixas de som, e, um subwoofer. Se estes equipamentos não tem a qualidade das peças compradas separadamente, são a melhor maneira de se entrar no mundo do hometheater, principalmente para espaços pequenos, com quartos ou salas com menos de 15 metros quadrados. Já estão disponíveis conjuntos de fabricantes nacionais, que podem ser adquiridos nos hipermercados, com preços que variam de mil a dois mil reais. Se você se enquadra no perfil, não custa nada dar uma espiada. Boa sorte!

Pré-Estréia: Um Príncipe em Minha Vida

Conto de fadas moderno, sobre a história de uma estudante, que se apaixona pelo príncipe dinamarquês Edward (Luke Mably). Ele se recusa a seguir as tradições de sua família, e, vai para os Estados Unidos, onde pode viver do jeito que quiser. Paige (Julia Stiles) e Edward vêm de mundos completamente diferentes, mas existe uma inegável atração entre eles. Quando chega a hora de Edward assumir o reinado, Paige tem de decidir se quer se tornar rainha ou realizar seu antigo sonho de ser médica. Pré-estréia nesta sexta-feira, sábado e domingo, em sessão única, às 21h30, no Cine 7 do Moviecom.


Odeon BR: união de dois mundos

De passagem pelo Rio de Janeiro, tive a grata surpresa de visitar um marco de resistência de nossa cultura, o Cine Odeon BR, que ressurgiu da decadência, graças a um patrocínio cultural da Petrobras Distribuidora (daí o BR no nome). Remanescente de uma época de ouro, onde a área, entre o Teatro Nacional e o Passeio Público, ganhou este nome por concentrar as melhores casas de espetáculo do Rio. Além do já citado Odeon, havia o Império, o Pathé, o Capitólio, o Rex (no prédio do hotel com o mesmo nome), o Rivoli, o Vitória, o espetacular Palácio, o Metro Passeio, e, já na fronteira sul, o Plaza e o Colonial. Destes, resta só a lembrança, já que a maioria deu lugar a modernos arranha-céus, virou garagem ou templo evangélico. Embora as modernas salas dos shopping center tenham servido para rejuvenescer o cinema, é muito bom freqüentar uma sala com o Odeon BR, com uma tela imensa, perfeitamente visível de todos os lugares, da frisa ao balcão, com direito a badaladas anunciando o início do filme. Bom para os cariocas e visitantes, que ainda dispõem do Odeon. Para os demais, resta a saudade, do tempo em que “Cinema era a melhor diversão”.

Filme recomendado: “Encontrando Forrester”

O primeiro segredo para escrever é…escrever.

O que poderia haver em comum, entre um adolescente bom de futebol, e, um escritor desiludido, além do fato de ambos morarem no mal-afamado morro de Mãe Luíza? Esse pequeno exercício de imaginação é para dar uma idéia do tema central do filme “Encontrando Forrester”, que mostra a inimaginável relação de amizade entre um negro de dezesseis anos, muito habilidoso no basquete, e, um escritor genial, enclausurado por mais de quarenta anos, após a publicação do seu único livro.

Moradores do Bronx, o bairro mais violento de New York, Jamal e Forrester só se conhecem por conta de uma aposta de adolescentes. Sem que ninguém soubesse sua real identidade, o escritor vivia recluso em seu apartamento, não saindo nem para fazer compras. O mistério sobre ele era tanto, que a vizinhança só o conhecia por “Janela”, correndo mil e um boatos sobre a pessoa estranha e violenta que morava ali. Por conta de um desafio dos amigos, Jamal invade o apartamento de “Janela”, mas, é flagrado pelo proprietário. Na fuga, perde a mochila, onde estão seus cadernos de anotações.

Na escola, Jamal recebe o resultado de um teste nacional, onde conseguiu notas num nível muito alto, o que chamou a atenção da direção da escola. Por conta desse resultado, e, de sua habilidade nas quadras, foi convidado para estudar numa sofisticada escola particular, em Manhatan. Nesse mesmo dia, recebe sua mochila de volta (literalmente caindo do céu), com os seus queridos manuscritos cheios de correções e apontamentos.

Curioso, o jovem procura “Janela”, sendo recebido com aspereza. Após alguma insistência, consegue entrar no apartamento, pois descobriram o que tinham em comum: o talento para escrever.

Enquanto melhorava o seu relacionamento com o estranho eremita, Jamal inicia seus estudos na escola nova, sendo recebido com carinho por Claire (Anna Paquin, a garotinha de “O piano”), e, com desconfiança por Crawford (F. Murray Abraham, o Salieri de “Amadeus”), professor de literatura, que não admite a idéia de que um jogador de basquete, vindo do Bronx, possa ter talento como escritor.

A rivalidade entre os dois atinge o máximo quando Jamal inscreve um texto no concurso literário do colégio. Por azar, o jovem usou o mesmo título de um artigo publicado numa revista por Forrester, muitos anos antes. Acusado de plágio por Crawford, fica entre deixar a escola, ou, admitir por escrito a culpa.

Mais do que uma simples disputa entre professor e aluno, o filme tem o seu maior valor na construção delicada da amizade entre Jamal e Forrester, que provoca mudanças em ambos. Enquanto Forrester consegue mostrar para o jovem que ele pode ser muito mais do um simples garoto do Bronx, Jamal esforça-se para tirar o eremita de seu esconderijo, levando-o a exorcizar seus fantasmas do passado.

Sem nenhum efeito especial, nem cenários grandiosos, o filme apoia-se num elenco de primeira linha. No papel de Forrester, Sean Connery, monstro sagrado do cinema, que só os mais maduros associam ao primeiro 007. Connery cria com perfeição seu personagem, variando entre a irascibilidade de um solitário à fraqueza inválida de uma criança perdida. F. Murray Abraham consolida sua carreira em papéis de vilões, lembrando muito o implacável Salieri de “Amadeus”. Anna Paquin, a garotinha de “O piano”, agora uma linda jovem, mostra que a indicação para o Oscar aos onze anos não foi por acaso. E, at least but not last, o estreante Rob Brown, um jovem novaiorquino que interpretou Jamal sem nunca ter feito teatro ou cinema antes. Fazendo uma ponta, aparece também o cantor de rap Busta Rhymes.

Num exemplo de como deve ser uma boa edição em DVD, “Encontrando Forrester” traz formato de tela widescreen, legendas em inglês, português e espanhol, e, pasmem!, áudio Dolby Digital 5.1, em inglês, espanhol e português… Como extras, um especial “Por trás das câmeras”, produzido pela HBO, com quinze minutos, o documentário “Encontrado: Rob Brown”, com doze minutos, cenas deletadas, trailers de cinema, e, filmografias. Detalhe: todos os extras são legendados.

Nestes tempos, onde os efeitos de computador reinam com absolutismo, é interessante ver um filme inteligente e sensível, onde as relações entre as pessoas mostram que o mundo é apenas o palco. Percebe-se o trabalho seguro de direção de Gus Van Sant, que fez filmes brilhantes como “Gênio indomável”, e, outros nem tanto, como a refilmagem de “Psicose”. Contudo, pegando carona numa das situações de “Encontrando Forrester”, é preciso conhecer as regras, para poder ignorá-las. Junte a família toda e curta a fita.