Planeta dos Macacos: O Confronto

Cada macaco no seu galho

Acredito que seja muito difícil, nos dias atuais, fazer a sequência de um filme famoso, principalmente se foi um sucesso tão memorável que o elevou à condição de clássico. Foi este o desafio imposto a “Planeta dos Macacos – O Confronto” (“Dawn of the Planet of the Apes”, EUA, 2014), que não apenas dá prosseguimento aos acontecimentos mostrados em “Planeta dos Macacos: A Origem” (“Rise of the Planet of the Apes”, EUA, 2011), como também tem o DNA de um filme antológico, “O Planeta dos Macacos” (“Planet of the Apes” EUA, 1968).

De antemão, eu já poderia opinar para os meus queridos leitores que a diferença fundamental entre o filme atual e o original de 1968 não se traduz apenas nos efeitos especiais impressionantes e tridimensionais gerados por computador que caracterizam as produções recentes. O que muda de um filme para outro, além das quatro décadas que os separam, é a forma como são retratados os relacionamentos de seus personagens.

No filme de 1968, estrelado por Charlton Heston, um grupo de astronautas terrestres viaja ao espaço em hibernação artificial e cai em um planeta desconhecido, cuja civilização dominante é formada por macacos, enquanto os humanos são incapazes de falar, e são mantidos como escravos dos símios.

Apesar de ser aparentemente uma história de ficção científica, o filme é uma fantástica crítica social ao preconceito e à intolerância, numa época agitada, em que o mundo vivia a luta pelos direitos civis, sob a influência da Guerra Fria, onde os protestos contra a Guerra do Vietnã ecoavam no movimento hippie, no amor livre e na busca pelo sentido da vida.

De uma forma absolutamente genial, “O Planeta dos Macacos” retratava essa intolerância através da relação entre macacos e humanos, bastando substituir, nos brilhantes diálogos, o termo “humano” por “negro”, “latino”, “imigrante”, “comunista”, ou qualquer classificação inferiorizante aos olhos dos extremistas da época.

O filme tem um final igualmente antológico, quando o personagem de Heston descobre onde está realmente. O filme fez tanto sucesso que rendeu nada menos de quatro continuações, um remake, dirigido por Tim Burton e estrelado por Mark Wahlberg, e um prequel em 2011, com James Franco, onde estaria a origem da civilização símia.

“Planeta dos Macacos – O Confronto” inicia mostrando numa sequência vertiginosa os acontecimentos causados por uma doença criada em laboratório – chamada de “gripe símia”, por ter sido testada em um macaco que fugiu e disseminou a doença.

O efeito da doença foi tão devastador que causou a morte fulminante de 90% da população humana, provocando o colapso da civilização. Enquanto isso, no interior de uma floresta próxima a São Francisco, uma grande colônia de macacos vive isolada, comandada por Cesar (Andy Serkis), em relativa tranquilidade.

Mas, essa paz é ameaçada quando um grupo de humanos penetra na floresta, e causa um grande reboliço entre os macacos. O grupo era comandado por Malcolm (Jason Clarke), que buscava reativar uma antiga hidroelétrica abandonada.

Numa demonstração de força, Cesar leva seus milhares de guerreiros até as portas da cidade, para dizer aos homens que se mantenham longe da floresta. Isso cria animosidades de parte à parte, pois Dreyfus (Gary Oldman), o líder dos humanos, não admite que os macacos imponham sua vontade.

Numa nova tentativa, Malcolm consegue chegar até Cesar, e graças à ajuda de sua mulher, que é médica, consegue salvar a vida da esposa do líder dos macacos, o que o leva a permitir a reativação da hidroelétrica.

E como existem espíritos de porcos tanto entre humanos quanto entre os macacos, logo os conflitos aparecem, e enquanto Cesar tenta sobreviver a um atentado, seus seguidores são liderados pelo briguento Koba (Toby Kebbell) para atacar a cidade dos homens.

Para satisfazer o público jovem, ávido por tiroteios e explosões, a verossimilhança é a primeira a morrer. De uma hora para outra não só os macacos estão fortemente armados, como as armas parecem não ter limite de munição. Eu imagino se qualquer um de nós teria dificuldade em manejar um moderno fuzil, até para descobrir como destravar e colocar em posição de tiro, imagine um macaco que nunca tinha pegado em uma arma. Mas, são coisas de cinema, e é melhor deixar o preciosismo de lado.

Um aspecto interessante, porém, é que, ao contrário do filme de 1968, que focava nos preconceitos pessoais, este mostra a intolerância entre os povos, e como sempre tem alguém disposto a botar lenha na fogueira.

Este, infelizmente, é um retrato atualíssimo do nosso mundo, onde testemunhamos uma série de conflitos regionais sem sentido, como a guerra da Ucrânia, o eterno conflito entre israelenses e palestinos, a guerra civil na Síria, além de todas as confusões na África subsaariana e a crescente tensão entre China e Taiwan.

 Com algumas falhas de roteiro, muitos efeitos especiais e cenas de ação, “Planeta dos Macacos – O Confronto” destina-se ao público juvenil, mas pode servir muito bem a estimulantes e úteis discussões sobre o relacionamento entre as nações, um conceito que, infelizmente, faz muita falta no mundo atual.