“A Noiva Perfeita” e “Dançar, Despertar do Desejo”

 

Como era gostoso o meu filme francês

 

Sempre que quero fugir um pouco do óbvio das grandes produções de Hollywood, eu volto minha atenção para os filmes franceses. Escolhi dois do gênero comédia romântica que dificilmente chegariam ao grande público, mas nem por isso são menos interessantes. Os filmes em questão são “A Noiva Perfeita” (“Prête-moi ta main”, FRA, 2006) e “Dançar – O Despertar do Desejo” (“Je ne suis pas là pour être aimé”, FRA, 2005).

Sou um pouco suspeito ao falar de filmes franceses, pois do cinema europeu certamente são os que mais me agradam. Isso ocorre tanto pela ousadia e naturalidade com que tratam qualquer tema, quanto pela utilização de atores “não-bonitos”, algo impensável em Hollywood, onde só bandido é feio.

“A Noiva Perfeita”, dirigido por Eric Lartigau, traz a marca do ator Alain Chabat, que além de interpretar o papel principal, deu a ideia para o roteiro e participou da produção do filme. Ele vive Luis Costa, um solteirão empedernido, que trabalha como “nariz” em uma indústria de perfumes.

A vida de Luis ia muito bem até que passa a enfrentar dois problemas. No trabalho, uma indústria cliente quer um perfume muito específico, no qual ele já trabalha há dois anos, sem conseguir chegar ao produto desejado. Na vida familiar, Luis é obrigado a aguentar as reclamações das quatro irmãs casadas e da mãe viúva, que decidem que é hora de que ele case.

Para se livrar das reclamações da família e conseguir se concentrar no trabalho, Luis tem uma ideia genial: ele contrata Emma (Charlotte Gainsbourg), a irmã de um amigo que está desempregada, para fingir que é sua noiva. Na hora do casamento ela não iria e ele, desolado, nunca mais iria querer saber de casamento.

A primeira parte foi fácil. A família inteira simplesmente se apaixona por Emma, e todos se envolvem totalmente na preparação do casamento. O problema é que, ao saber da ausência da noiva, a mãe de Luis, Geneviève (Bernardette Lafont), passa mal, e ele é obrigado a trazer Emma de volta.

Para resolver a situação, outra ideia infalível: ela agora irá fazer tudo para que a família dele passe a detestá-la. Mas, por mais que ela cometa as maiores gafes e barbaridades, sempre é desculpada. Para complicar a situação, Emma havia se candidatado à adoção de uma criança brasileira e a quebra do pretenso casamento poderia prejudicá-la…

“A Noiva Perfeita” é um romance leve, divertido e despretensioso e embora tenha um final obvio, o espectador fica torcendo para que as coisas se encaminhem a contento.

“Dançar, Despertar do Desejo” é um filme que dificilmente irá chamar a atenção numa locadora, a não ser pelo apelo erótico do título, que não existe no filme, é bom salientar. O título original em francês, “Je ne suis pas là pour être aimé”, alguma coisa como “eu não sou para ser amada”, tem mais a ver com a história. O filme é um drama leve, intimista e delicado, que trata, principalmente, do amor na maturidade.

A história é mostrada através da ótica de Jean-Claude (Patrick Chesnais), um cinquentão divorciado, que vive uma vida absolutamente sem emoções, tomando conta de um cartório que herdara do pai. Seguindo a tradição, ele deverá passar o mesmo negócio para o filho (Cyril Couton), que havia começado a trabalhar com ele, mas sem nenhum entusiasmo.

A rotina monótona de Jean-Claude só é quebrada no final de semana, quando visita o pai (Georges Wilson), que está num asilo, e passa as tardes de domingo jogando Banco Imobiliário com ele. O idoso não faz outra coisa senão reclamar com o filho, durante tais visitas. A relação de Jean-Claude com o pai é fria e distante, tal como a que tem com o próprio filho, que detesta o cartório e preferiria ficar em casa, tomando conta de suas plantas.

O fato novo que vem quebrar a engessada e infeliz vida de Jean-Claude é quando, ao fazer um check-up com um médico, este o aconselha a fazer alguma atividade física, caso contrário irá morrer logo. Avesso a esportes e outros esforços, Jean-Claude decide então se inscrever em uma academia de dança de salão próxima ao seu cartório.

Na escola de dança, cheia de casais devidamente emparelhados, ele conhece Françoise, ou Fan-Fan (Anne Consigny), uma atraente mulher entre os 30 e os 40 anos de idade, que está para casar e quer aprender tango para a festa do casamento. O noivo (Lionel Abelanski) é um escritor que padece de falta de inspiração e nunca comparece às aulas de dança.

Enquanto Fan-Fan é assediada por um colega (Olivier Claverie), Jean-Claude mantém-se ausente, participando das aulas mas sem interesse por ninguém em especial. Um fato do passado, da mãe de Jean-Claude ter cuidado de Fan-Fan quando criança, faz com os dois iniciem uma amizade.

O filme trata, com muita delicadeza, da construção do relacionamento dos dois, em meio aos seus problemas pessoais, e tendo a dança como principal elo de ligação. Fan-Fan é quem se sente mais dividida, pois os preparativos do casamento se avolumam, quase sempre decididos pela mãe e pela irmã, enquanto ela vive outra vida graças à escola de dança.

A descoberta da situação de Fan-Fan e a morte do pai irão mudar totalmente a vida de Jean-Claude, que descobrirá que as histórias mais tristes são aquelas que nunca são contadas. Caberá a ele agora indicar os melhores caminhos para o filho, para Fan-Fan e para si próprio.

Para quem estiver cansado dos tiros e explosões das superproduções, sugiro dar uma conferida nestes títulos para curtir um bom romance francês (embora isso seja quase um pleonasmo), e lembrar que muitas vezes a viagem mais longa e difícil é aquela que fazemos dentro de nós mesmos.