2001: Uma Odisséia no Espaço

Viagem infinita

 

Embora possa parecer estranho que minha escolha desta semana seja uma produção de mais de meio século, é inegável a importância deste filme de ficção-científica que figura em todas as listas de melhores filmes de todos os tempos. Afinal, trata-se da união de dois gênios, o escritor Arthur C. Clarke e o cineasta Stanley Kubrick.

Minha relação com o filme “2001: Uma Odisséia no Espaço” (“2001: A Space Odissey”,EUA,1968) vem de longe, mais precisamente 1969. Em julho daquele ano, quando passava minhas férias em Recife, testemunhei a chegada do Homem na Lua e quase assisti “2001”. Quase, pois meu primo não quis ir, e eu perdi a chance (você ainda está me devendo essa, Ulissinho).

Finalmente, em 1977, no Rio de janeiro, pude realizar o desejo de assistir o sonhado filme. Quando soube que era o último dia de uma retrospectiva, fui correndo para um pequeno cinema na Glória, entrei no meio da sessão (na época, podia) e fiquei para a próxima (também podia). Achei o filme complexo, mas, como já tinha vinte anos e alguma bagagem de ciência e ficção científica, fiquei do lado dos fãs de Stanley Kubrick.

Algum tempo depois é que pude ler o livro de Artur C. Clarke, que ao contrário do que se imagina, não foi a origem do filme. Como Clarke trabalhou com Kubrick no roteiro do filme, o livro saiu meio que em paralelo, e explicava muitas coisas que o filme deixava subtendido.

E para os que explicam essas lacunas como falhas de roteiro, eu diria que é impossível para uma pessoa tão perfeccionista como Kubrick deixar alguma coisa na edição final que não fosse intencional. Afinal, um diretor que repete 78 vezes uma cena em que alguém abre a porta e diz “alô”, até ficar perfeita, não condiz com a imagem de quem deixa um filme incompleto – a não ser que seja essa a intenção.

“2001: Uma Odisséia no Espaço” é uma sequência de vários capítulos temporais. No primeiro, muito antes de qualquer sombra de civilização, um grupo de hominídeos pré-históricos recebe a visita de um estranho monólito, que os ensina a usar armas e alimentar-se de carne, iniciando a dominação da Terra pelo Homem.

Quatro milhões de anos depois, encontramos uma nave fazendo o trajeto da Terra à Lua, onde o Dr Heywood Floyd (William Sylvester) vai investigar um estranho monólito que foi encontrado enterrado por autores desconhecidos, mas seguramente extraterrestres. Quando a luz do Sol toca o monólito pela primeira vez, uma onda de rádio é gerada.

Na próxima sequência, a gigantesca nave espacial Discovery ruma em direção a Júpiter, conduzida pelos astronautas David Bowman (Keir Dullea) e Frank Poole (Gary Lockwood), que contam com a ajuda do computador HAL 9000, a última palavra em inteligência artificial. Entretanto, próximo do objetivo final, HAL entra em conflito com os tripulantes humanos, matando Frank e mais três cientistas que estavam em hibernação artificial.

Só então, David descobre o objetivo verdadeiro da missão, que era descobrir o destinatário da emissão em rádio enviada pelo monólito da Lua. O receptor, uma versão muito maior do monólito lunar, revela-se um portal que conduzirá o astronauta por uma viagem inimaginável.

O filme, hermético e com poucas explicações, é um deslumbre de efeitos visuais, principalmente se considerarmos que não existia nada de computação gráfica na época. Tudo era feito com maquetes, pinturas e muita, muita inteligência. Com justiça, rendeu a Douglas Trumbull o Oscar de Efeitos Especiais, embora também tenha sido indicado nas categorias de Direção de Arte, Roteiro e Diretor.

Curiosamente, os primeiros resultados de bilheteria apontavam para um fracasso total. Contudo, ao fim do primeiro mês, foi observado que muitos jovens assistiam sessões seguidas do filme. O boca-a-boca funcionou mais que o marketing dos estúdios, e o sucesso se consolidou, transformando-o num dos filmes mas cultuados de todos os tempos.

O formato DVD trouxe às novas gerações a beleza do filme que o VHS não permitia, e o Blu-ray permitiu que a alta definição homenageasse a beleza do balé sideral ao som de uma trilha sonora surpreendente, que vai do “Danúbio Azul” de Johann Strauss ao famosíssimo tema “Assim Falou Zaratustra”, que é tocado nos lugares e ocasiões mais improváveis.

Os documentários, que estão tanto no blu-ray quanto na edição em DVD dupla são: “2001: o Making Of de um mito”, “A perspectiva de Kubrick: o legado de 2001”, “A visão de um futuro passado: a profecia de 2001”, “2001: Uma Odisséia no Espaço – Um olhar atrás do futuro”, “O que tem aí?”, “2001: FX e o início de uma arte conceitual”, “Olhe: Stanley Kubrick!” e “Entrevista com Stanley Kubrick de 27/11/1966 (somente áudio)”. O filme traz ainda comentários em áudio de Keir Dullea e Gary Lockwood.

Recomendo a todos que façam uma releitura deste filme, principalmente se tiverem acesso aos documentários, que fornecem um painel completo da época em que o filme foi feito, das previsões que não se realizaram, e dos muitos acertos surpreendentes de Kubrick, um verdadeiro gênio do cinema.